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CARLOS HEITOR CONY
O muro e a crise
RIO DE JANEIRO - Desconfio
que já contei esta história, aqui ou
em outro canto qualquer. Ano da
Graça de 1989, queda do muro de
Berlim. Operários de uma fábrica
entram em greve. Após muitas manifestações de rua, o dono do negócio decide receber uma comissão do
sindicato.
Trata a todos cordialmente, serve
café e água gelada, depois pergunta:
"Vocês não sabem que o muro caiu?
Esse negócio de greve já era, os tempos são outros, vamos trabalhar pelo bem de todos nós e do Brasil".
O mesmo começa a acontecer
com a crise que o mundo atravessa.
Já ouvi dizer que o buraco nos bancos norte-americanos chega a trilhões de dólares. Honestamente,
nem sei o que isso significa, não faço a menor ideia do que isso representa. Um operário brasileiro tampouco saberá o que seja um trilhão
de qualquer coisa, sobretudo de
dólares.
Mas a senha está lançada e aceita
internacionalmente. Invocando a
crise, os governos cortam investimentos e verbas, as empresas enxugam a folha de pagamento, os bancos aumentam as taxas, o crédito é
diminuído e a legião dos devedores
cresce a cada dia. É a crise.
Aqui no Brasil, o presidente manda o povo consumir para aquecer o
comércio e a indústria. As autoridades financeiras não se entendem
sobre o tamanho e a consequência
da crise. Tudo bem, quer dizer, tudo
mal. Nas altas esferas, trata-se de
um tema acadêmico tão controverso que alguns chegam a negar que
exista realmente uma crise.
Na base da pirâmide, o homem
comum, que nem imagina o que seja um trilhão de dólares, se já entendia pouco do sistema financeiro,
passa a entender cada vez menos.
Mesmo assim, adivinha que qualquer reivindicação salarial será cortada pela raiz. Tal como a queda do
muro de Berlim, a crise no sistema
capitalista aviltará mais ainda o
mercado do trabalho.
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