São Paulo, terça-feira, 27 de janeiro de 2009

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MARCOS NOBRE

Duas ideias ruins

APRENDER é uma experiência bem-sucedida quando forma uma pessoa autônoma, que aprende pouco a pouco como aprender por si mesma. Isso não quer dizer que pessoas autônomas aprendam sozinhas. Significa que aprendem a receber o que é ensinado como material para formar uma opinião própria e bem fundamentada.
Não há maior frustração do que ver estudantes universitários sendo tratados e se comportando como crianças. Há certamente muitas causas bastante difusas para isso, desde o nível precário dos outros níveis de ensino até a expansão descontrolada do ensino superior ou mesmo o prolongamento sem fim da adolescência.
Mas pelo menos uma dessas causas é bem determinada e fácil de ser removida. Por razões bastante difíceis de compreender, há quem pense que quanto mais horas passa dentro de uma sala de aula, mais uma pessoa aprende. Vem daí a exigência de 200 dias letivos anuais para o ensino superior.
Esse tipo de exigência acaba gerando o efeito contrário: colabora em muito para transformar a universidade em um colegião. Estudantes quando muito repetem nas provas e nos trabalhos aquilo que professores dizem em sala de aula.
É um círculo perverso: estudantes não têm tempo para estudar, no sentido mais amplo da sua formação como pessoas autônomas. Porque passam tempo demais dentro de uma sala de aula.

 

Desde os anos 1990 circula a ideia de suprimir o mestrado do ensino de pós-graduação. Argumenta-se que é necessário concentrar recursos humanos e financeiros no mais importante, que é o doutorado.
É estranho ter que lembrar que o Brasil não é os EUA nem a Alemanha. Na origem da bem-sucedida implantação da pós-graduação estava a ideia de que a valorização do mestrado produziria os padrões acadêmicos necessários para criar cursos de doutorado sólidos, o que de fato aconteceu.
O papel do mestrado hoje é bem diferente. Com a transformação da graduação em um colegião, a eliminação do mestrado tornaria o curso de doutorado acessível a recém-formados somente se perdesse muito em qualidade. Ou se passasse a formar um número muito menor de doutores do que hoje. Além disso, os programas de doutorado mais concorridos seriam dificilmente acessíveis a candidatos provenientes de cursos de graduação menos bem avaliados.
Eliminar o mestrado só vai rebaixar o nível do doutorado ou torná-lo privilégio de um grupo ainda mais restrito. E criar mais uma injustiça: tornar a melhor pós-graduação inacessível a quem não vier já dos cursos mais fortes do país. nobre.a2 uol.com.br

MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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