São Paulo, quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Apenas começa o Brasil dos Brics

CANDIDO MENDES


Fugindo à fatalidade das hegemonias, nosso país tem pouquíssimos rivais neste carteado novo da diferença e da autonomia internacional


A política externa não avulta ainda entre os nortes marcantes do governo Dilma. Mas é difícil de imaginar capital mais rico para esse novo protagonismo brasileiro, avultado ao fim do governo Lula.
Entramos numa globalização liberada da marca hegemônica pelo governo Obama. Deparamos o advento dos Brics, destruindo, de vez, as geopolíticas imperiais, de centros e periferias.
Não se trata apenas de reconhecer as similaridades e, ainda, os contrastes desse advento comum no cenário mundial, do Brasil, da China e da Índia, todos voltados para gigantescos mercados internos, em distintos reptos do seu desenvolvimento sustentável.
É aí que o Brasil confronta os seus pares gigantes, somando à expansão econômica a mobilidade social e o avanço do modelo democrático. O importante é, de vez, o nosso desgarre à moldura latino-americana e a assunção de uma liderança internacional nada terceiro-mundista.
O Brasil de Lula evitou o confronto com as ditas nações bolivarianas, mas deixa muito clara a obsolescência de Hugo Chávez nesse quadro de um antiamericanismo "bushista" e da debilidade crescente da "realpolitik" petrolífera da Venezuela diante do gigantesco futuro de nosso pré-sal.
Nesse salto atlântico, a nova presença brasileira na África sai das limitações de assistencialismo crônico para a amplitude de novos créditos para o desenvolvimento, como assinalado em nosso reforço às entidades bancárias internacionais.
É no Oriente Médio, entretanto, que a aproximação do Brasil com a Turquia modificou a visão dos jogos de forças regionais, trazendo a discussão dos impasses nucleares iranianos pela ONU. Dissociamo-nos, por aí mesmo, da obsessão pela cadeira permanente no Conselho de Segurança pelo peso real da nossa voz no mundo islâmico.
É o que resulta da valorização de nosso influxo sírio e libanês e da nitidez do apoio à Palestina, dando exemplo às nações do Mercosul.
Sobretudo, o trunfo de agora é o de já superarmos tanto a marca de país periférico como a de emergente, nos alinhamentos dos G-20 e suas contas sempre incompletas de reforço do bloco.
Fugindo à fatalidade das hegemonias, temos pouquíssimos rivais neste carteado novo da diferença e da autonomia internacional.
Mas a garantia do desenvolvimento sustentado e da prosperidade repartida, ou da superação do modelo neoliberal, no advento de Dilma é a de um sistema que não muda a regra do jogo no suporte democrático, por maior que seja a popularidade dos seus líderes e a crença nos carismas iluminados.

CANDIDO MENDES, membro da Academia Brasileira de Letras e da Comissão de Justiça e Paz, é presidente do "Senior Board" do Conselho Internacional de Ciências Sociais da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) e secretário-geral da Academia da Latinidade.

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