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OTAVIO FRIAS FILHO
Guerra e paz
Nada está claro no que diz respeito à tão anunciada guerra dos
Estados Unidos contra o Iraque, nem
mesmo se haverá guerra. Embora a
decisão americana pareça tomada,
três fatores contribuem para miná-la
ou retardá-la: a oposição de França,
Alemanha, Rússia e China; as concessões a conta-gotas do Iraque; as manifestações de massa em escala global.
O próprio motivo da guerra é incerto. Fala-se no petróleo iraquiano, mas
ele sempre esteve lá sem que os americanos julgassem necessário apossar-se
do país. Teriam o diagnóstico de que,
como pensam alguns analistas, cedo
ou tarde o regime pró-ocidental da
Arábia cairá? Tratam de se aproveitar
de um pretexto qualquer para assegurar o controle das reservas iraquianas?
É possível. A perspectiva brasileira,
tão distante do eixo desses acontecimentos, não nos coloca a salvo de suas
consequências. O aumento da instabilidade e a retração dos negócios terão
efeitos nefastos na já combalida economia internacional. Países dependentes e mais vulneráveis do que nunca, como o Brasil, estarão entre os
mais expostos a essas consequências.
Na tentativa de esclarecer algo dos
motivos dessa guerra e de desvendar a
sua lógica -ainda que para condená-la-, é útil acompanhar os argumentos de seus apologistas. Segue um resumo desses argumentos, tal como
têm aparecido, com variantes de ênfase e de detalhamento, na imprensa anglo-americana, hoje engajada, em
grande parte, na causa da guerra.
O pressuposto é bem conhecido. Os
atentados de 11 de setembro de 2001
evidenciaram a fragilidade dos Estados Unidos diante de um inimigo sem
rosto. O poder de redes terroristas é
amplificado e se torna efetivo quando
elas são respaldadas por um Estado
hostil. É preciso, de acordo com o raciocínio, decapitar preventivamente
os Estados que possam oferecer tal
respaldo.
Mas o raciocínio vai além. Com o
desaparecimento do relativo equilíbrio entre duas superpotências, que
manteve o mundo "em ordem" durante a Guerra Fria, o acesso à soberania nacional passa a ser decorrência
da posse de armas nucleares. Oito países -incluído Israel, que se recusa a
admiti-lo- já estão nessa condição;
serão nove se o regime da Coréia do
Norte não for detido a tempo.
Sempre conforme a argumentação
belicista, se os Estados Unidos, que
são o único país em condições de
atuar como polícia internacional, não
agirem preventiva e exemplarmente,
como se dispõem a fazer contra o ditador iraquiano, logo haverá dezenas de
países dotados de capacidade nuclear.
Se alguns deles adotarem atitude hostil, não haveria como dissuadi-los.
A opção seria entre uma guerra localizada agora ou um futuro em que os
Estados fracos estariam à mercê de
novas potências nucleares, capazes de
ameaçar também as potências tradicionais. Quanto disso é lógica e quanto é paranóia? Em que medida uma
intervenção agora, em vez de prevenir
esse cenário dantesco, poderá precipitá-lo? São as perguntas de sempre
quando se trata de guerra e paz.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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