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Buraco externo
Deficit do país em suas transações correntes embute prejuízos que um ajuste "natural" da taxa de câmbio não remediará
O AUMENTO do deficit do
país em sua conta corrente -que contabiliza
transações de bens e
serviços com o exterior- superou as expectativas do mercado,
que já não eram positivas, em
março passado.
Os números recém-divulgados
indicam que o deficit acumulado
nos últimos 12 meses atingiu
US$ 31,3 bilhões. A persistir a
trajetória atual, um resultado
negativo da ordem de US$ 50 bilhões parece provável para 2010.
O saldo comercial, que contabiliza apenas a exportação e a
importação de produtos, permanece positivo em US$ 23,3 bilhões nos 12 meses encerrados
em março, compensando parte
das despesas de serviços (entradas e saídas de lucros e dividendos, juros, fretes etc.), de US$
57,8 bilhões no mesmo período.
Não se pode esquecer que esse
bom resultado decorre dos elevados preços das matérias-primas, e não do crescimento dos
volumes embarcados.
Há poucas semanas foi oficializado, por exemplo, o aumento de
quase 100% no preço do minério
de ferro, que deve adicionar até
US$ 10 bilhões às exportações
deste ano. Os termos de troca do
país (preços das exportações em
relação aos das importações) já
superaram o patamar pré-crise
nos últimos meses. Mas não é razoável contar com preços sempre crescentes.
Já os embarques de produtos
manufaturados recuperaram,
até março, muito pouco -menos
de 25%- da queda de 2008. Os
problemas são os de sempre: impostos altos, burocracia excessiva, logística problemática e câmbio valorizado, que diminuem a
competitividade da indústria nacional em relação a outros países, sobretudo os asiáticos, os
quais continuam a ampliar sua
participação no mercado global.
Com isso o Brasil não adquire
escala suficiente para incorporar
tecnologia de ponta em diversos
setores industriais.
Do lado das importações, o
quadro é oposto. O crescimento
da demanda doméstica provoca
uma verdadeira explosão dos volumes importados, que já superam com larga margem os níveis
anteriores à crise -em mais de
30% no caso de bens de consumo
duráveis. Considerando que as
remessas de serviços também
serão crescentes, forma-se um
quadro preocupante.
Não se trata de prever uma crise cambial, pois o Brasil tem reservas internacionais elevadas, o
governo é credor em moeda estrangeira e o regime de câmbio é
flutuante. E, até o momento, a
entrada de capital externo tem
sido mais do que suficiente para
compensar o deficit em conta
corrente, tanto que o Banco Central continua a acumular dólares.
Mas é importante reconhecer
que há problemas com o atual
modelo de crescimento, calcado
em consumo sem a suficiente
contrapartida de poupança interna e num deficit externo cada
vez mais alto.
O presidente do BC está certo
ao dizer que o mercado ajustará
o câmbio em resposta aos saldos
negativos nas contas externas.
Mas nada garante que o ajuste
ocorra sem antes impor graves
prejuízos às empresas brasileiras
e à capacidade de crescimento da
economia nos próximos anos.
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