São Paulo, terça-feira, 27 de junho de 2006

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ROBERTO MANGABEIRA UNGER

Prioridade nacional

O QUE PRECISA para traduzir em obra transformadora nosso aparente e ainda vazio consenso a respeito da necessidade de fazer da educação prioridade nacional? Três revoluções factíveis e entusiasmantes. Revolução de responsabilidade. O governo federal, trabalhando em conjunto com os Estados e os municípios, tem de ser responsabilizado pela disponibilidade e pela qualidade do ensino básico em todo o país. O alvo é substituir em pouco tempo nossos seis anos de escolaridade média por 12 e construir escola pública boa o bastante para atrair a classe média, como fiadora e reivindicadora de sua qualidade. Mínimos nacionais, sistematicamente monitorados, de investimento por aluno e de desempenhos por escola. E poderes e recursos para intervir, sob vigilância judicial, quando e onde os mínimos deixarem de ser cumpridos. O Fundeb é um começo. Efetivada na educação, essa flexibilização do regime federativo serve para tudo na política social. Revolução de abrangência. Escola que ocupa o aluno quatro horas por dia não é séria. Precisa ocupar o dia todo. E fornecer alimento e cuidado médico e dentário, engajando famílias e comunidades. Não temos de começar por construir prédios nem de ir, num só salto, de quatro horas para oito. Avancemos pragmaticamente, de acordo com as possibilidades: o rumo importa mais do que o tamanho de cada passo. Revolução de conteúdo. Não é verdade que a alternativa ao ensino enciclopédico e memorizador seja a falta de rigor travestida de modernismo pedagógico. Não se aprende matemática aprendendo a analisar e a resolver problemas? Pois o mesmo se dá em qualquer campo do conhecimento: desenvolver capacitações para analisar, sintetizar, reformular e reconstruir é o que importa. Para isso, é preciso qualificar o professorado, com incentivos de avanço profissional providenciados pelo governo federal. E garantir oportunidades acadêmicas e apoios econômicos especiais para os alunos pobres mais talentosos e esforçados. Sejam eles formados como vanguarda republicana para tomar o lugar de uma elite de herdeiros e de apadrinhados. Aí está a essência de um projeto com potencial para mudar o futuro e o presente do país se a tarefa for imaginada com ousadia, defendida com autoridade intelectual e política e executada com a necessária combinação de ardor, eficiência e realismo. Mudará o futuro graças às capacidades que constrói. Mudará o presente por meio da esperança e da energia que desperta. É a libertação do Brasil. www.law.harvard.edu/unger


ROBERTO MANGABEIRA UNGER escreve às terças-feiras nesta coluna.


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