São Paulo, segunda-feira, 27 de junho de 2011

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Verdades maduras

Um quarto de século após o fim da ditadura, país ainda hesita em arejar os arquivos sobre violações de direitos humanos sob égide do Estado

A presidente Dilma Rousseff dá sinais de querer acelerar a votação do projeto de lei que cria a Comissão da Verdade, para escrutinar e esclarecer casos de violações dos direitos humanos no Brasil.
Embora os trabalhos devam abranger o período de 1946 a 1988, o que está em jogo, na realidade, são os crimes cometidos durante a ditadura militar, entre 1964 e 1985.
O empenho do Executivo para tirar a comissão do papel é positivo. Mas não deve atropelar o debate necessário sobre as atribuições e a forma de funcionamento dessa comissão. Há pontos importantes a serem questionados.
Pelo texto original do projeto, as reuniões do grupo poderiam ser fechadas, para "resguardar a vida privada, a honra ou a imagem" de algumas pessoas. Além disso, está previsto que "dados, documentos e informações sigilosos" não poderiam receber divulgação.
Não é esse o melhor caminho para uma comissão que, já no nome, se define pela busca da verdade. Os familiares de mortos e desaparecidos têm direito ao registro histórico dos fatos, da maneira mais transparente possível, sem disfarces nem sigilos.
Por conveniência ou pragmatismo, os governos democráticos adiaram demais a solução do problema. Já passou da hora de o Estado prestar contas à sociedade, jogando luz sobre episódios ainda obscuros do período autoritário.
Houve avanços, é verdade, desde que o presidente Fernando Henrique Cardoso criou, em 1995, a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos. O Estado reconhecia, pela primeira vez, sua responsabilidade pelos desaparecimentos políticos e elaborava uma lista oficial das vítimas da ditadura.
Apesar dessa iniciativa, restam ainda cerca de 140 vítimas efetivamente "desaparecidas". Seu paradeiro, como parece provável, estaria registrado em documentos hoje inacessíveis à opinião pública.
O trabalho da comissão, que deve ser o mais abrangente e desimpedido, não pode, porém, se confundir com uma revisão da Lei da Anistia, de 1979. Ainda em abril do ano passado, o Supremo Tribunal Federal decidiu por sete votos a dois que a lei não deveria ser alterada para possibilitar a responsabilização penal dos indivíduos envolvidos em crimes como a tortura -ou como ataques terroristas, no caso dos adeptos da luta armada.
Prevaleceu no STF o entendimento de que a anistia veicula um desejo de conciliação nacional e integra os fundamentos do acordo que deu origem ao Estado democrático em que vivemos.
Será sinal de maturidade do país se, respeitado o pacto de não responsabilização, o conhecimento da verdade se realizar sem qualquer tipo de obstáculo ou segredo.


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