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LUCIANO MENDES DE ALMEIDA
Sebastião,
meu amigo
Desde que cheguei a Mariana,
MG, há quase 15 anos, fiquei conhecendo Tião, o pipoqueiro da praça
Gomes Freira. Ao sair de casa para ir à
catedral, quase sempre me encontrava
com ele. Seu carrinho de pipoca ficava
entre o coreto e o museu, sob uma
frondosa árvore que lhe garantia a
sombra nas horas de sol.
Sebastião da Silva Borges, Tião, tinha mais de 60 anos. Simpático, comunicativo. Falava com todos os que
passavam a caminho da Sé. Gostava
de brincar, contando piadas para alegrar os outros. As crianças vinham ver
de perto o carrinho de pipoca. Tião
não fazia questão de dinheiro. Aos
mais pobrezinhos, dava de graça um
punhado de amendoim torrado ou
um pedaço de doce de leite.
Pouco a pouco, fui conhecendo esse
homem bom. Estava a par dos acontecimentos do dia, graças ao radinho estridente e sempre ligado. Orientava os
turistas. Enternecia-se diante do sofrimento. Falava sempre de seus "filhos". Eram muitos. Tião não era casado, mas, com o auxílio de sua irmã,
cuidava de dezenas de crianças sem
família, trabalhando dia e noite para
sustentá-las. Preocupava-se com a
saúde e os estudos dos que ia acolhendo ao longo dos anos. Criou mais de
30 "filhos". Queria bem a todos.
Perguntei-lhe uma vez como conseguia alimentar tantas crianças. Apontou, sorrindo, para o carrinho de pipoca e para as maçãs açucaradas. Dizia que Deus cuidava dos filhos e não
permitia que faltasse nada. Contava,
também, com o apoio de gente boa no
bairro pobre onde morava, em Ouro
Preto, de onde vinha todos os dias para Mariana.
Com o passar dos anos, Tião já não
conseguia vender tanta pipoca. Outros carrinhos mais modernos e iluminados ocuparam a praça, atraindo os
turistas. Tião nunca perdeu o bom humor. Procurava compensar as poucas
entradas com vendas maiores nas cidades vizinhas, em dias de festa, e assim continuava alimentando -com
seu carrinho- as dezenas de filhos
que Deus lhe dava. Sofreu muito com
a doença e o falecimento precoce de
alguns de seus filhos e filhas e, mais
ainda, com a morte de sua irmã.
Nos últimos meses, percebi que Tião
já não era mais o mesmo. Denotava
cansaço. Emagreceu. Sentava-se no
banco da praça e quase não dava atenção às pipocas.
Quinta-feira à noite (25/7), correu a
notícia. Tião tinha morrido. Fui logo
ao velório em Ouro Preto. Seus amigos estavam em volta do corpo coberto de flores brancas. Sereno, Tião parecia sorrir.
Ficamos rezando e agradecendo a
vida simples desse homem bom e generoso. Muitas crianças conseguiram
viver graças ao afeto de Tião e ao carrinho de pipoca. A dedicação de Sebastião é exemplo para nós. Era um homem de fé. Amava a Deus e ao próximo como Jesus ensinou.
Com seu trabalho humilde -sob
sol e chuva-, mal agasalhado nos
dias de inverno, confiava em Deus,
vendia pipoca para ganhar o dinheirinho que repartia com os mais pobres
do que ele. Não tinha outra ambição
do que viver a caridade, fazendo o
bem.
Deus acolhe no céu a quem acolheu
tantas vidas em sua casa, nesta terra.
Sorrindo, Tião, conversando com
todos, estará abraçando muitos "filhos" que amou e educou para a felicidade.
D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.
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