São Paulo, segunda-feira, 27 de agosto de 2007

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ALBA ZALUAR

Foco é precisão

O DILEMA das políticas universalistas ou focais já foi superado, visto que há um acordo sobre a necessidade de políticas compensatórias para fazer frente à desigualdade inicial observada nos setores destituídos da população. Mas as políticas focais só são eficazes quando o diagnóstico da situação e a delimitação do setor populacional a ser beneficiado é preciso. Caso contrário, pode-se pensar que a compensação sirva mais ao clientelismo político, cujo objetivo é sobretudo eleitoral. Neste caso, a compensação monetária pessoal torna-se prêmio pela lealdade a um político ou governo.
O uso de categorias mal definidas, como mães da paz ou jovens em estado de vulnerabilidade, deve ser mais bem pensado para que o Pronasci não perca o rumo da intervenção social.
Senão, vejamos. Alguém conhece mães que sejam da guerra? Que mães estão excluídas da categoria da paz? Em três décadas de pesquisa de campo, nunca encontrei mães que estimulassem seus filhos a participar de guerras de quadrilhas. Também não sei de mães que incentivem seus filhos a andar de moto, outro fator de risco para jovens vulneráveis à atração do consumo moderno por ser o maior motivo para acidentes que oneram o serviço público de saúde no Brasil. Foram esquecidos no Pronasci.
Deparei, porém, com tios e tias que, com seu trabalho voluntário, criaram encontros e conversas informais em locais públicos, associações recreativas, religiosas ou de moradores, times esportivos etc. E todos os jovens que gravitavam em torno de quadrilhas sempre afirmaram que a vontade de acabar com o sofrimento de suas mães era o principal motivo para saírem da vida bandida.
Não seria mais sensato o apoio financeiro a projetos, aliás já existentes, que se valem do trabalho voluntário ou pago de pessoas treinadas para ajudar tais jovens a mudar de vida? Não já está claro que a cultura cívica do respeito ao outro, do diálogo e da eqüidade deveria estar sendo difundida em todas as escolas, associações e meios de comunicação de massa? Apostar em mediadores já faz parte de muitos projetos existentes pelo país afora.
Por fim, jovens vulneráveis, além de armas, valorizam o uso de drogas ilegais das quais perdem o controle. Usuários fissurados, especialmente no crack, fazem subir as estatísticas criminais, como aconteceu em São Paulo e em Belo Horizonte na década de 90. No Rio de Janeiro, a presença mais recente desta droga já aumenta os assaltos e homicídios. Não há nada no Pronasci sobre a prevenção e tratamento desses usuários. E se o dinheiro recebido por alguns deles for usado para pagar o vício?


ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta coluna.

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