|
Próximo Texto | Índice
Editoriais
editoriais@uol.com.br
Teatro mambembe
No caso do tucanoduto, repetem-se ingredientes e personagens da farsa representada à exaustão pelos mensaleiros do PT
DENÚNCIA não é culpa,
afirmou o ministro
Walfrido dos Mares
Guia, precavendo-se
desde já da possibilidade de ser
citado pelo procurador-geral da
República por seu envolvimento
no chamado "mensalão mineiro". Frases como esta têm sido
tão comuns na vida política brasileira que seria o caso de algum
parlamentar mais ousado propor
que seja adotada no lugar do velho mote de "ordem e progresso"
inscrito em nossa bandeira.
A tese chegou a ser exportada
pelo presidente da República ao
delicado cenário das relações internacionais: o Irã, cujo programa de enriquecimento nuclear
inspira justificadas preocupações nas democracias ocidentais,
"não cometeu nenhum crime até
agora", declarou Lula em sua
passagem por Nova York.
Sendo atualmente escassa, nas
hostes presidenciais, a quantidade de xiitas -este o nome que ganhavam, em outros tempos, os
petistas mais extremados-,
quem sabe Mahmoud Ahmadinejad não poderia constar, tão
variáveis costumam ser as vicissitudes da política brasileira, como um nome indicado para
substituir o próximo ministro a
ser afastado pelos escândalos em
que se enredou.
Não se estranhe o tom humorístico da cogitação: é que, sem
contar o seu potencial destrutivo
sobre as instituições, assume aspectos de comicidade grotesca o
espetáculo encenado pelos políticos brasileiros, tanto no governo quanto na oposição. A farsa se
desenrola em vários capítulos, é
farta em personagens e abusa
dos mesmos ingredientes.
Há, por exemplo, o amigo
pronto a emprestar altas quantias, que nunca serão devolvidas,
a candidatos e partidos. Walfrido
dos Mares Guia é quem hoje encarna esse papel: admitiu ter assumido uma dívida de R$ 511 mil,
correspondente a um déficit no
caixa dois na campanha do tucano Eduardo Azeredo à reeleição
para o governo de Minas.
Ex-presidente do PSDB, Azeredo apresenta-se no palco como
o "homem de bem": assim o qualifica seu correligionário Aécio
Neves, num ambiente em que a
prática do caixa dois funciona
como um atestado de moralidade pública, diante das irregularidades mais graves que é preciso
ocultar.
O desafinado e roufenho coral
tucano entoa, nos intervalos da
opereta, a mesma canção que
tanta vaia e alarido produziu ao
ser ensaiada pelo PT: não há
"mensalão", não há corruptos,
não há evidências, e de tudo o
que se fez, ninguém sabia de nada; logo, ninguém será punido.
A comédia não dispensa a personagem de um factótum, inventivo, veloz e expedito; é talvez o
mais experiente ator de todas as
trupes, e atende pelo nome de
Marcos Valério. Há um banco, de
onde vêm os empréstimos; e há a
Viúva, única personagem digna
de comiseração em todo o espetáculo, que paga pelos contratos
superfaturados que possibilitaram toda a produção.
Tucanos e petistas trocam acusações pelos fiascos sucessivos, a
despeito do entrecho semelhante e de alguns personagens em
comum. Cai o pano: "Denúncia
não é culpa", pode-se ler em letras bordadas. Não cobre a contento, todavia, todos os participantes da farsa.
Próximo Texto: Editoriais: Irresponsabilidade no ar
Índice
|