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Do pânico à política
Ação do Congresso no projeto de Bush de ajuda financeira mostra que crise não justifica abrir mão de rito democrático
NÃO SERIA fácil, em nenhuma circunstância,
aprovar no Congresso
americano o plano do
governo Bush de salvação econômica. A Casa Branca pede aos legisladores que autorizem um
gasto extraordinário de US$ 700
bilhões. O secretário do Tesouro
teria total liberdade para fixar os
critérios do repasse desse dinheiro a instituições financeiras
privadas em sérias dificuldades.
As decisões não estariam sujeitas a contestação judicial.
A bomba financeira e a solicitação de poder demiúrgico pelo
Executivo -incompatível com a
tradição de freios e contrapesos
que vigora nos EUA há mais de
200 anos- coincidiram com a
reta final de uma eleição geral.
No dia 4 de novembro, estarão
em disputa a Casa Branca, a Câmara dos Representantes (deputados federais), 1/3 do Senado e
11 governos estaduais.
Não espanta, portanto, que a
votação do pacote tenha entrado
num impasse na quinta-feira -e
que a rebeldia contra um acordo,
que pareceu a caminho no início
do dia, tenha partido da Casa dos
deputados, cujos 435 assentos
estarão em jogo. A minoria republicana alegou dificuldades para
convencer suas bases eleitorais
de que mobilizar US$ 700 bilhões de dinheiro do contribuinte é mesmo a melhor solução para aplacar uma crise privada.
Em paralelo, outras modificações importantes no pacote, pela
ação da maioria democrata,
eram negociadas com o governo
Bush. O partido de Barack Obama defende que o governo tenha
mecanismos para capturar parte
dos lucros das instituições financeiras que tomarem recursos públicos -no caso de elas se recuperarem mais à frente. A proposta, aparentemente aceita pela
Casa Branca, é que o governo se
torne acionista dessas empresas
em troca da ajuda financeira.
A adoção de um mecanismo de
supervisão -um comitê independente que fiscalizaria as decisões do Tesouro-, a imposição
de um limite à remuneração dos
executivos de instituições socorridas e um auxílio aos mutuários
ameaçados de perder a casa também estão em negociação. Todas
essas emendas, se efetivadas, vão
melhorar a proposta original, no
sentido de dotá-la de mais controle, eficiência e abrangência.
Não se sabe se o pacote que
surgir desse debate será suficiente para interromper o curso da
derrocada em cadeia de bancos e
financeiras. Mas a intervenção
do Congresso americano dá o
bom exemplo de que, mesmo em
crises agudas, que exigem reação
imediata, os rituais da democracia não podem ser abandonados.
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