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ANTONIO DELFIM NETTO
Lula lembra Deng
O discurso do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva na posse da
diretoria da Firjan foi altamente revelador do pragmatismo que o acompanha desde quando era negociador sindical e que tem sido responsável pelo
sucesso que até aqui o seu governo
tem conseguido no nível macroeconômico.
A mensagem central e confortadora
para os que ainda têm dúvidas sobre a
orientação do governo foi envolvida
num exagero ("a ideologia morreu..."), mas isso não lhe tirou a objetividade essencial: "Quem está com os
pés no barro não quer saber se o asfalto será feito pelo setor privado ou pelo
governo". Foi mais uma explicitação
da mudança ideológica do Partido dos
Trabalhadores feita num dos templos
do capitalismo.
Não é possível deixar de identificar
nessa posição o mesmo pragmatismo
que levou Deng Xiaoping, depois de
reabilitado, a transformar em 25 anos
a velha e atrasada China numa das potências mais admiradas do mundo. A
mensagem de Deng tinha duas partes:
1) em lugar do famoso final do "Manifesto Comunista", de 1848 -"proletariado de todo o mundo, uni-vos"-,
ele proclamou: "chineses de todo o
mundo, enriquecei-vos" e 2) "não interessa a cor do gato, desde que ele
apanhe os ratos".
Foi a lenta redução dos preconceitos
dos empresários contra o velho sindicalista, transformado em presidente
de todos os brasileiros, que criou as
"condições para a volta ao desenvolvimento". A dissipação das resistências
demorou porque muito pouca gente
acreditou na "Carta aos Brasileiros",
na qual o candidato Lula apresentou o
"novo programa do PT", plenamente
integrado aos princípios da Constituição de 1988.
O ano de 2003 foi complicado. Uma
recessão combinada com uma política
cambial que estimulou as exportações
acelerou a geração do primeiro superávit em conta corrente desde 1992, indicando uma correção importante na
nossa vulnerabilidade externa. Puxado pelo setor externo, o agrobusiness
mostrou sua competência. Lentamente, o estímulo exportador foi se transmitindo aos demais setores da economia.
Confirmou-se assim, mais uma vez
(há dezenas de experiências semelhantes), que, cada vez que um governo é razoavelmente amigável ao setor
privado e não impede que os agentes
econômicos se apropriem legalmente
dos benefícios de suas iniciativas, o
"espírito animal" dos empresários se
encarrega de produzir o crescimento.
A despeito de toda a sofisticação das
teorias para explicar o desenvolvimento, ele no fim se resume a um "estado de espírito".
Os economistas podem construir
"funções de produção" que incorporem ao mesmo tempo a Sorveteria
Aurora de Guaxupé e a Companhia
Siderúrgica Nacional. Podem divertir-se separando o que supõem ser a contribuição de cada fator (trabalho, capital e tecnologia). Mas, se lhes faltar a
imaginação, a capacidade de adaptação e o vigor do "espírito animal" do
empresário, as "funções" serão apenas peças mecânicas. E, se faltar ao
"espírito animal" do empresário um
ambiente ecológico favorável (o "espírito de desenvolvimento" criado pela
liderança política), ele abortará.
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br
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