São Paulo, quarta-feira, 28 de janeiro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A sucessão municipal paulistana

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS

Delineia-se, nas eleições municipais de 2004, uma batalha decisiva a ser travada na cidade de São Paulo com vistas às eleições presidenciais de 2006.
São Paulo é a vitrine do PT em nível municipal, considerando o governo central -independentemente do melhor ou pior resultado da administração federal- que é imprescindível manter a prefeitura da maior cidade do país em suas mãos, objetivando a reeleição de Lula e eventual conquista do governo do Estado.
Todos os partidos têm, por seu lado, a convicção de que a vitória da prefeita Marta fortalecerá, consideravelmente, o Partido dos Trabalhadores e as chances de seu crescimento no cenário nacional.


Dessa vez, para o PSDB e o PFL, uma vitória de Marta seria pior para suas pretensões que a de Paulo Maluf


Leva a agremiação do presidente da República algumas vantagens sobre os demais partidos, ou seja, maior disponibilidade de recursos, pela destinação de parte dos subsídios de seus filiados que se encontram no exercício de cargos públicos, além de virem destinando à publicidade verba superior à de quaisquer governos anteriores, na União, nos Estados e nos municípios que administram. Têm, por outro lado, a certeza de haver maior simpatia nos segundos e terceiros escalões dos meios de comunicação, sobre gozarem de indiscutível preferência de grande parte dos ministérios públicos Federal e Estadual, além de estar parcela substancial dos cargos federais e dos governos petistas preenchida por correligionários.
Seus dirigentes sabem, todavia, que a política de austeridade fiscal do governo federal, neste ano, não deverá ter resultados cinematográficos para efeitos de projeção social ou econômica. Tal realidade pode dificultar seu projeto de crescimento e de implantação de uma república socialista à moda brasileira.
Por essa razão, voltam seus líderes a atenção, principalmente, para a prefeitura paulistana, preparando-se, como em eficiente manobra militar, para fornecer a logística necessária de apoio e contra-ataques à concentração de fogo que deverá partir de todas as agremiações políticas com candidatos à sucessão municipal.
Seu grande trunfo são os centros de educação, que, a meu ver, como educador há quase 50 anos, nasceram à luz de uma concepção ultrapassada de ensino. Hoje, a eficiência educacional reside na multiplicação de núcleos e escolas com classes de poucos alunos, e não na concentração deles em megacentros e megaclasses. Seu ponto fraco está na série de contratações de particulares para a prestação de serviços públicos -sem licitação- e de servidores públicos -sem concurso-, assim como na destruição de sistemas viários que funcionavam bem -ressalte-se: com a clara intenção de melhorá-los ainda mais (o tempo dirá se valeu a pena)-, retirando recursos que poderiam ser utilizados na pavimentação e urbanização de toda a cidade, onde ainda há bolsões de miséria e falta de infra-estrutura. Acresce-se o brutal aumento da carga tributária e da publicidade oficial, que o povo já não suporta.
De qualquer forma, as suas realizações serão altamente valorizadas pelos marqueteiros oficiais, e seus insucessos, minimizados.
Na oposição, pelas primeiras pesquisas, se o PSDB tivesse José Serra como candidato estaria ele na frente da prefeita, como também, tal qual nas que precederam as eleições passadas, o eterno candidato Paulo Maluf.
A margem que separa os três é, todavia, muito pequena. Seria enorme se se somassem os votos de Serra e Maluf, mas, permanecendo os dois ou se for outro o candidato do PSDB em lugar de Serra, o mais provável é que um deles não vá para o segundo turno, sendo quase certo que Marta lá estará.
Poderá ocorrer, entretanto, que os dois nomes do segundo turno sejam Marta e Paulo, como ocorreu nas eleições passadas, com resultado, possivelmente, não tão previsível quanto naquelas eleições.
É que, dessa vez, para o PSDB e o PFL, uma vitória de Marta seria pior para suas pretensões que a de Paulo Maluf, filiado a partido cuja expressão nacional tem diminuído ano após ano. Assim, em tese, para os filiados dessas duas agremiações partidárias seria preferível um candidato a que sempre se opuseram à outra, que fortaleceria seu principal adversário nas eleições de 2006, ou seja, o presidente Lula.
Por isso, não afasto a possibilidade, nas próximas eleições, se Serra não for o candidato e se Paulo e Marta forem para o segundo turno, de as antipatias e as restrições à candidatura Paulo Maluf não serem tão intensas como nas eleições anteriores, o que seria fato curiosíssimo, na sempre curiosa história da democracia brasileira, em que, muitas vezes, o pragmatismo político vale mais do que as ideologias e, certamente, muito mais que os ideais.

Ives Gandra da Silva Martins, 68, advogado tributarista, professor emérito da Universidade Mackenzie e da Escola de Comando do Estado-Maior do Exército, é presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo.


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