São Paulo, quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

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KENNETH MAXWELL

O presidente da Câmara

É RECONFORTANTE cruzar o Atlântico em fevereiro, da gélida Nova Inglaterra, para passar um fim de semana no condado de Devon, na velha Inglaterra. Em Devon, a primavera já chegou.
Também é causa de alívio descobrir que os jornais locais estão muito menos preocupados com as eleições americanas do que com o pentanacional de rúgbi e com dois "serial killers", trazidos à Justiça por meio do uso de DNA como prova.
Para não mencionar os casos de abuso contra crianças na ilha de Jersey, local bem conhecido dos políticos brasileiros que tentam ocultar seus ativos. São essas histórias que ocupam as manchetes.
Temos também o caso do "senhor presidente". É o escândalo que gira em torno de Michael Martin, presidente da Câmara dos Comuns britânica. No final de semana, o porta-voz de Martin pediu demissão, alegando que "alguém" no gabinete da presidência da Câmara o havia iludido e levado a fazer falsas declarações à imprensa. Mary Martin (a mulher do presidente da Câmara, não a atriz) aparentemente gastou 4.000 libras em táxis, pagos pela conta de despesas da presidência da Câmara em expedições de compras. O porta-voz informara aos jornalistas que esses passeios eram assunto oficial, e que a senhora Martin havia sido acompanhada às compras por um "funcionário administrativo". Na verdade, ela foi acompanhada por sua empregada doméstica. Surgiram novas revelações: uso de milhagem acumulada em função de viagens oficiais para bancar viagens de família; alegações de abusos das verbas de habitação e por aí vai. E quem será o responsável por investigar essas alegações? Ninguém menos que o próprio senhor Martin.
O presidente da Câmara dos Comuns é um escocês amarfanhado da classe trabalhadora, que ostenta um forte sotaque e deixou a escola aos 15 anos de idade para se tornar metalúrgico, líder sindical e uma das figuras centrais do Partido Trabalhista. A imprensa, de esquerda e de direita, pediu sua renúncia, mas os políticos trabalhistas se uniram em defesa de Martin, alegando que ele é vítima de preconceitos de classe e região. "As pessoas que estudaram em escolas particulares e nas universidades de Cambridge e Oxford não gostam que um homem da classe trabalhadora nascido em Glasgow chegue ao mais alto posto do país", foi a explicação proposta por lorde Foulkes de Cumnock.
Para evitar que essa defesa do presidente da Câmara dos Comuns por um membro da Câmara dos Lordes pareça incongruente, é necessário apontar que lorde Foulkes é outro político escocês de classe operária que ascendeu das fileiras do Partido Trabalhista.
O assunto parece familiar? Alô, Brasília, você não está sozinha!


KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras nesta coluna.
Tradução de PAULO MIGLIACCI


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