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CARLOS HEITOR CONY
A carne assassina
RIO DE JANEIRO - Não, não me
refiro àquele inimigo da alma: a
Carne, que, junto com o Diabo e o
Mundo, renunciamos no momento
em que somos batizados. O padre
pergunta ao recém-nascido se ele
renuncia ao Diabo, ao Mundo e à
Carne. Como o batizando ainda não
fala, fala o padrinho, que renuncia
ao Diabo, ao Mundo e à Carne em
nome da criança. O padrinho funciona como uma espécie de laranja.
A carne a que me refiro é a carne
mesmo, de boi, porco, cabrito, cordeiro ou de qualquer outro animal
que tenha carne vermelha, como a
nossa. Descobriram que a carne faz
mal, é uma carne assassina. Tal como o fumo, que tira 15 minutos de
vida a cada cigarro que se fuma.
Dentro desse cálculo, eu já deveria
ter morrido há uns 40 anos, nem sei
como continuo vivo. Mais para lá do
que para cá, mas vivo.
Quando ministro da Saúde, o Zé
Serra impôs aquelas figurinhas nos
maços de cigarro para desestimular
os fumantes. Homens cadavéricos
morrendo em CTIs, em cadeiras de
roda após enfartes violentos e até
mesmo impotentes sexuais. Valeu
tudo, todas as mazelas físicas e espirituais para mostrar os malefícios
do fumo.
Mais dia, menos dia, com a carne
vermelha acontecerá o mesmo. Ela
não será proibida, porque haverá
lobby de produtores, frigoríficos,
açougues, churrascarias, restaurantes etc. Mas, a cada bife que recebermos em nossa mesa, virá alguma
forma de advertência, uma imagem
espetada em cima da carne, estampando um caixão de defunto, um
cemitério, uma caveira com os ossos cruzados, como na bandeira dos
piratas.
Confesso que ficarei deveras impressionado. (Nunca usei o "deveras", mas usado está.) Nem por isso
deixarei de apreciar um bife suntuoso, uma picanha na brasa. Sem
prazer, a vida não vale a pena, mesmo que a alma não seja pequena.
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