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DIREITOS DRIBLADOS
Já se tornou um lugar-comum
equiparar os mecanismos legais
que extinguem o passe no futebol à
Lei Áurea, que, em 1888, pôs um fim
à escravidão. Infelizmente, a comparação não é exata. Seria mais justo dizer que o fim do passe, da forma como se deu, se assemelha à Lei dos Sexagenários, de 1885, que libertou os
escravos com mais de 60 anos.
Os clubes de futebol conseguiram
manipular as coisas para garantir
que, ao menos em relação aos jovens
atletas, algo bastante semelhante ao
passe permaneça vigorando.
A MP que prometia acabar com o
passe é uma monstruosidade jurídica que ofende até mesmo quem tem
apenas noções primárias de direito.
Antes de mais nada, esse instrumento legal está longe de ser o mais indicado para regular a questão.
Como se não bastasse, a MP cria a
estranhíssima figura da indenização
de "formação", que prevê o pagamento de multa milionária ao clube
que revelou o atleta, na hipótese de
rompimento do primeiro contrato.
Produz, ainda, a indenização de
"promoção", que dá ao clube direitos sobre o jovem atleta mesmo depois do término do contrato. Os clubes, obviamente, podem rescindir o
contrato quando desejarem incorrendo apenas nas penalidades ordinárias. A inconstitucionalidade não
poderia ser mais gritante.
As multas previstas, então, são escandalosas. No caso da indenização
de "formação", o clube que contratar
o atleta deverá pagar um montante
de até 200 vezes o salário anual do jogador à instituição que o formou. A
título de ilustração, é oportuno lembrar que o atleta que quisesse dispor
de si mesmo teria, antes, de trabalhar
200 anos para o "empregador". Se
for o caso de indenização de "promoção", bastam 150 anos.
Se isso não é uma forma bastante
perversa de escravidão, fica difícil
imaginar o que seja.
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