São Paulo, quarta-feira, 28 de março de 2007

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CLÓVIS ROSSI

Dar entrevista não dói

SÃO PAULO - Só para lembrar: quando terminava a sabatina que a Folha fez com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na antevéspera do segundo turno, ele disparou: "Vou encher a paciência de vocês de tanto dar entrevistas" (paciência não foi o termo empregado, mas sou obrigado a passar a limpo a linguagem presidencial).
Cinco meses depois da eleição e três meses após a segunda posse, Lula não cumpriu a promessa -mais um incumprimento, aliás.
Só tem falado no que chamo de cenas de jornalismo explícito, aquele amontado de câmeras e microfones junto ao céu da boca do entrevistado, que raramente produzem algo aproveitável.
Já que parece ter medo de jornalistas, sugiro ao presidente que, ao menos, siga o modelo da Espanha.
O Canal 1 (estatal) da TV local levou ontem ao ar o programa "Tenho uma pergunta, senhor presidente" (embora o regime seja parlamentarista, o chefe de governo na Espanha é chamado de presidente, não de primeiro-ministro).
Mas as perguntas não são de jornalistas, e sim de um grupo de cidadãos selecionados por uma empresa especializada em capturar amostras representativas do conjunto da população.
Na semana que vem, será a vez de o líder da oposição submeter-se às perguntas.
Sei bem que prestar contas ao público não faz parte dos usos e costumes nestes trópicos, mas não custa relembrar que esse tipo de entrevista não dói, não mata nem torna aleijado o entrevistado.
Aliás, contém uma segunda lição: TV estatal pode, sim, ser pública, no sentido de pôr no ar questionamentos tanto ao governante de turno como ao chefe de turno da oposição. Mas não dá para esquecer que, no Brasil, há uma fenomenal vocação para o jornalismo chapa branca, que encontraria um anabolizante adicional em uma TV pública (ou estatal).


crossi@uol.com.br

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