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BORIS FAUSTO
A repressão em Cuba
Ao lado da quase unânime condenação dos recentes atos repressivos em Cuba, ressalvada a dubiedade -para dizer o menos- do governo brasileiro (amigos são para essas
coisas?), vale a pena tentar entender
um pouco as razões desses atos.
Em primeiro lugar, eles chamam a
atenção pela irracionalidade. Fidel
Castro perde bem mais do que o apoio
de alguns ilustres passageiros do barco das ilusões. Uma ducha de água fria
atinge alguns congressistas e empresários americanos, dispostos a pressionar pelo levantamento do embargo
e das viagens turísticas, impostos pela
lei Helms-Burton. Esfriam os países
integrantes da União Européia, que
vem realizando esforços há anos, no
sentido de manter e ampliar relações
comerciais e culturais com Cuba. É o
caso particularmente da Espanha,
principal promotora de um acordo de
cooperação da UE, condicionado ao
avanço dos direitos humanos na ilha.
A repressão desfechada por Fidel
parece resultar de temores representados pelo governo Bush e de uma situação interna catastrófica. Sob o primeiro aspecto, por mais que seja evidente
a disposição do presidente americano
de modelar o mundo segundo o que
considera ser os interesses estratégicos de seu país, são muito poucos os
indícios de que Cuba seja hoje um
centro de atenções. Mesmo que fosse,
a escalada repressiva surge como um
excelente pretexto para endurecer o
embargo e desacreditar a política promovida pelo governo Clinton, que
abriu caminho para a maior liberalização de viagens e para as remessas dos
imigrantes, a ponto de estas terem superado as receitas provenientes da exportação do açúcar.
Quanto à situação interna, em artigo
publicado no Boletim do Real Instituto Elcano de Madrid, o pesquisador
Francisco Leon lembra que todo o Caribe atravessa uma deterioração do
quadro econômico, em consequência
da queda dos fluxos turísticos, a partir
do 11 de setembro, sendo a deterioração agravada pelo estancamento econômico global e pela guerra do Iraque.
No caso específico de Cuba, junte-se a
esse fator a crise da indústria açucareira, que resultou no fechamento de
mais de 50 engenhos e em forte redução da população ocupada. O peso cubano vem perdendo valor, o mercado
negro cresceu, a dependência das remessas dos emigrantes também e o
desemprego entre os jovens causa
muitos descontentamentos.
Tudo indica que a leitura que o governo cubano faz dos fatores apontados é uma leitura de guerra fria, quando Cuba causava profundas preocupações ao governo americano, como
mostrou a desastrada aventura da
baía dos Porcos. Só que, sem a proteção soviética, esta é a guerra fria de um
órfão que, na sua solidão, trata de cortar dissidências pela raiz, sem dar ouvidos a ninguém.
Estamos, pois, diante de um ato "defensivo", de um ato de fraqueza do regime, em que talvez entrem as disputas, a portas fechadas, pela sucessão.
Isso pode representar, no médio prazo, uma esperança para os dissidentes
condenados a longas penas de prisão.
Para os outros -os fuzilados- a esperança foi liquidada sem volta.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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