São Paulo, domingo, 28 de maio de 2006

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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

A outra China

NO ARTIGO anterior, focalizei os números que mais me impressionam sobre a China. Neste pretendo apresentar o outro lado da moeda -o dos problemas. No aludido artigo, mencionei a perigosa escassez de água, o que põe em risco a agricultura e a vida dos cidadãos. Um outro obstáculo é a degradação do meio ambiente. O Banco Mundial diz que a China possui 16 das 20 cidades mais poluídas do mundo, e o combate a esse problema está custando cerca de US$ 170 bilhões por ano. A migração maciça do campo para as cidades é outra questão grave. A ONU estima em 200 milhões os camponeses que irão para os centros urbanos ao longo desta década. O Banco de Desenvolvimento da Ásia vai mais longe ao falar em 300 milhões. São pessoas que chegarão a cidades onde faltam moradias, saneamento e transporte. Essa marcha em direção ao mundo urbano é propelida pelo forte desemprego nas zonas rurais. As estatísticas do trabalho da China não são firmes, mas as estimativas mais consistentes indicam a existência de quase 300 milhões de desempregados em todo o país, estando 200 milhões na zona rural. A convulsão urbana só não eclodiu porque o país tem um regime com grande poder punitivo. A despeito disso, as coisas estão mudando. Nos próximos dez anos, cerca de 480 milhões de trabalhadores rurais almejam trabalhar nas indústrias, onde o emprego é mais estável e os salários são mais altos. Por mais acelerado que seja o crescimento econômico, será impossível acomodar tanta gente em tão pouco tempo. Mesmo porque os que estão nas cidades começam a se inquietar com as más condições de vida. A análise de Rubens Barbosa deixa claro que as questões sociais nas fábricas, vilas e cidades estão cada vez mais críticas, forçando uma melhor distribuição de renda, que, aliás, é pior do que a do Brasil ("A classe operária vai à luta", Rubens Barbosa, "O Estado de S. Paulo", 24/1/2006). Os dados de pobreza são impressionantes. O Fórum sobre a Pobreza, realizado na semana passada em Pequim, revelou existir cerca de 73 milhões de chineses com renda que mal dá para comprar roupa e comida. A ONU estima que a realidade seja o dobro disso ("China tem 200 milhões vivendo na miséria", "O Globo", 18/5/2006). Ou seja, a China é um gigante vigoroso na área econômica, mas terá de investir muito para controlar os problemas do meio ambiente, da migração, do desemprego e das más condições de vida da maioria dos chineses. Será que, nessa hora, o país continuará crescendo a 10% ao ano?


ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES escreve aos domingos nesta coluna.
antonio.ermirio antonioermirio.com.br


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