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FERNANDO DE BARROS E SILVA
A saúde do doente
A elite paulistana e os formadores de opinião, pessoas que costumam ler os jornais e aparecer neles,
têm tratado Paulo Maluf até agora como um candidato café-com-leite. Os
comentários oscilam entre a estupefação mais ou menos revoltada e o desdém mais ou menos irônico, mas todos, sem exceção, consideram que o
ex-prefeito é um bufão condenado a
morrer na praia, enroscado num cipoal de assinaturas, papéis suspeitos e
montanhas de dólares ilícitos que dormem em paraísos fiscais -e no imaginário de cada um de nós. Em suma:
acredita-se que, como ele, também
sua candidatura não é séria.
Dá-se ainda de barato que a disputa
real se travará entre Marta e Serra, entre o PT e o PSDB: o que está em jogo
em São Paulo é a consolidação da hegemonia política do petismo ou a sinalização da volta dos tucanos ao poder central. O bom senso nos leva a
crer que seja mesmo assim.
Além de acossado, Maluf é um candidato politicamente isolado, sem
muito tempo na TV e apoios partidários, questionado dentro do próprio
PP, do qual até há pouco era o dono
inconteste. Ex-malufistas menores ou
em ascensão migraram para outras
paragens, mais prósperas. É o caso do
vice de Serra, o pefelista Gilberto Kassab, ex-secretário de Pitta.
É também a trajetória de Valdemar
Costa Neto, presidente do PL, partido
aliado de Marta e bem acolhido na vice de Lula. E o que dizer do PTB de
Roberto Jefferson, o collorido, e
Fleury, filho enjeitado do quercismo?
Hoje são todos chapas do Planalto.
Pouca gente parece se incomodar
com isso, embora Serra não esconda
um mal-estar que não se verifica mais
nos petistas, aprendizes de feiticeiro
cujo pragmatismo vai empilhando cadáveres no cemitério da ética.
A gangsterização do petismo é o fenômeno mais relevante da política
brasileira nos últimos anos. O barateamento sumário das aspirações coletivas de que o partido era o maior portador é a face mais visível de uma conversão política sem precedentes, a
qual acanha e acanalha os horizontes
do país e vai transformando-o, aos
olhos do mundo, num "suave fiasco",
segundo a boa definição recente de
um embaixador. É possível que a ressaca social resultante desse fenômeno,
que apenas começa a ser sentida, já se
materialize no resultado das eleições
deste ano.
O palco da guerra em São Paulo está
armado, mas a batalha mal começou.
Pela amostra das trocas de farpas entre Marta e Serra durante as convenções do final de semana, vê-se que o
jogo pesado não se dará em torno de
Maluf, que no entanto é peça estratégica para as ambições de PT e PSDB.
Do ponto de vista da prefeita, Maluf
precisa se manter candidato, mas fragilizado. Se o doente sucumbir, Serra
se beneficia; se melhorar de saúde, pode deixar Marta fora do segundo turno. Administrar a dose desse remédio
que não cura nem mata é hoje o desafio do PT. Para os tucanos, a morte política de Maluf poderia significar até
uma vitória no primeiro turno. Não é
esse, porém, o cenário que se desenha.
Os votos de Maluf concentram-se
entre os mais pobres e menos escolarizados, como mostra a pesquisa Datafolha divulgada ontem. Culpar o povo
ignorante? Os herdeiros do populismo são os deserdados de dez anos da
política econômica tucano-petista.
Fernando de Barros e Silva é editor de Brasil.
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