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DELAÇÃO PREMIADA
Controvertido , o instituto
da delação premiada, pelo qual
o criminoso obtém redução de sua
pena ao entregar seus comparsas,
tem como ponto de partida um comportamento que provoca viva repulsa
moral. De fato, os traidores jamais
caem nas graças da história. No caso
do facínora que comete perfídia contra seus cúmplices, a condenação
moral é dupla: por delinqüir contra a
sociedade e por faltar com lealdade
para com seus companheiros. É sintomático que a "lei do cão" vigente
nas cadeias seja especialmente severa
com os traidores.
Num plano mais pragmático, porém, a delação premiada é um instrumento útil para a proteção da sociedade. Se bem utilizada, ela permite desbaratar grandes redes criminosas que tanto prejuízo causam à coletividade. E, se há uma preocupação
que o Estado não precisa ter, é a de
fazer valer a ética entre criminosos.
O que importa do ponto de vista do
poder público é estabelecer claramente as situações em que a colaboração do réu com a Justiça pode resultar em diminuição da pena. Não
há dúvida de que essa possibilidade
pode dar lugar a muitos abusos.
Um bandido apanhado em flagrante delito poderia, por exemplo,
delatar um desafeto e com isso, de
um só golpe, vingar-se de um rival e
ainda reduzir a própria pena. Perceba-se que o inimigo do réu pode ser
eventualmente um inocente.
Um grande traficante talvez pudesse livrar-se de alguns anos de cadeia
ao entregar às autoridades as pessoas que trabalhavam para ele, contrariando o espírito da lei, que exigiria a delação de criminosos hierarquicamente superiores.
É também necessário garantir que
a polícia e o Ministério Público não
tomem palavra de marginais como
prova condenatória. Tudo o que pessoas de conduta absolutamente duvidosa podem fornecer são hipóteses
que vão ou não confirmar-se à luz
das evidências que apareçam no curso das investigações.
Estranha à tradição jurídica brasileira, a delação premiada começou a
encontrar espaço por aqui a partir
dos anos 90. Importado dos EUA e
da Itália, hoje o instituto está disperso numa série de diplomas pouco
conexos, como a Lei de Crimes Hediondos (8.072/90), a Lei de Proteção
às Testemunhas (9.807/99) e a nova
legislação sobre entorpecentes
(10.409/02). Talvez seja o caso de
consolidar esse emaranhado de regulamentações numa peça única e
detalhá-la mais um pouco.
A sociedade pode e deve proteger-se contra a ação de quadrilhas, mas
isso não significa que deva incentivar
denúncias irresponsáveis feitas por
bandidos. São, aliás, de funesta memória os momentos históricos em
que o Estado se pôs a patrocinar delações em geral. Casos concretos
atendem pelo nome de Alemanha
nazista, Rússia stalinista e América
macartista. Todo cuidado é pouco.
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