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CORRUPÇÃO ENRAIZADA
É pertinente o argumento de
que a formulação e a aprovação
de reformas político-eleitorais sob o
signo da crise atual correm o risco de
contemplar propostas irrefletidas ou
casuísticas marcadas pela pressa em
oferecer respostas "rigorosas" aos
problemas institucionais que favoreceriam a corrupção.
Há, de fato, mudanças a fazer que
induzam à adoção de procedimentos
mais republicanos pela política brasileira. Não é aceitável, porém, transferir para o arcabouço político-eleitoral a responsabilidade pelo festival de
irregularidades cometidas nesse
campo pelo PT e pelos demais partidos que se serviram de recursos de
caixa dois e de outros expedientes ilícitos para obter vantagens.
Um mínimo de respeito à ética, à
decência e à honestidade provavelmente surtiria melhor efeito. Parte-se, porém, entre nós, do pressuposto
de que esse tipo de compromisso
inexiste para amplos setores da classe política. Por absurdo que pareça,
exigir correção moral de parlamentares, governantes e dirigentes de partidos soa para muitos como uma ingênua e pueril fantasia -algo como
pretender que um animal deixe de
reagir de acordo com seus instintos.
Lamentavelmente, esse comportamento encontra respaldo numa sociedade em que a informalidade impera em suas diversas faces e os preceitos éticos e legais são com freqüência vistos como algo a ser observado por terceiros -em especial os
menos informados e pouco sagazes.
Dos delitos do cotidiano, como entrar em acordo com um profissional
liberal para realizar pagamentos sem
emissão de nota, aos grandes esquemas de sonegação fiscal ou captura
de fundos públicos, estende-se pela
sociedade toda uma trama de complacências e licenças que faz da burla
-ou do "jeitinho", em seu pior sentido- quase que um traço nacional.
São sintomáticas quanto a isso as
próprias palavras do presidente da
República ao minimizar o uso de caixa dois pelo PT com o argumento de
que o partido apenas faz o que todos
sempre fizeram. Ainda que seja verdade -e tudo indica que sim-, o
raciocínio ecoa a frase do humorista
Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta
(1923-1968): "Ou restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos."
É óbvio que a corrupção não é uma
fenômeno de apenas um país. Aqui,
porém, a prática é enraizada e pouco
combatida. Essa é possivelmente
uma das explicações para o pragmatismo de alguns observadores internacionais, que, consultados sobre o
escândalo, não demonstram surpresa. Afinal, não há mesmo novidade
em partidos e governos corruptos na
América Latina. E a administração
petista, que tudo mudaria, vai se revelando apenas uma espécie de versão revista e atualizada do antigo populismo que fez história na região.
Mais do que mudar regras para
eleições e partidos, seria mais eficaz
se o país contasse com uma polícia e
uma Justiça preparadas para cumprir
a contento as suas funções. São essas
instituições que podem, na prática,
mostrar o grau de rigor com que o
Estado zela pelo cumprimento das
leis -investigando os delitos e punindo os infratores independentemente de classe social.
Quanto à questão político-eleitoral,
é possível, por ora, que se promovam
alguns ajustes, mas uma verdadeira
reforma precisaria, pelo menos, ser
mais bem discutida, evitando que em
breve novas propostas surjam em cena dando seqüência a uma contraproducente sucessão de casuísmos.
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