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JOSÉ SARNEY
Boas instituições, bons frutos
EM TODAS AS crises políticas
brasileiras, as pequenas e as
grandes, a primeira idéia que
surge é de concertar o que os costumes não consertaram, com nova
legislação. Legisla-se para tudo, a
toda hora, e sempre se pedem mais
leis. O resultado é que, de tantas
leis, terminamos por viver sem leis.
José Honório Rodrigues, o grande historiador moderno do Brasil
-e outro dia me advertiram que
ele não estava mais sendo editado-, tem um estudo sobre "Conciliação e Reforma no Brasil", no
qual aborda as muitas reformas
que foram propostas e as nenhumas reformas que foram feitas.
A primeira grande voz a clamar
por reforma antes que viesse a revolução foi o conselheiro Nabuco
de Araújo. Muitas delas não vieram, e a única e grande revolução
que verdadeiramente se reconhece
como feita foi a Abolição da Escravatura, porque atingiu a estrutura
da sociedade. As outras eram somente destinadas às elites.
Quando se fala de voto e transparência, por exemplo, no tempo da
colônia, os eleitores eram contados
excluindo os judeus, os não-católicos, os soldados e até os nascidos
em Portugal, mas os analfabetos
votavam.
A República, que devia ser fundada na cidadania -e o principal
direito do cidadão é constituir seu
autogoverno-, acabou com o voto
dos analfabetos: o nosso Ruy Barbosa, tão patriota e tão civilista, defendeu e colocou na Constituição a
proibição de que eles votassem. E
assim ficaram, atravessando quatro constituições, 34, 37, 46, 67, excluídos do colégio eleitoral. O argumento era que o desejo de votar estimularia as pessoas a aprender. Isso nunca funcionou, e o analfabetismo ficou como uma grande chaga na população brasileira.
Agora é, mais uma vez, hora da
discussão da reforma política, que
não vai sair nunca, porque a confortável eleição do voto proporcional uninominal não deixa que as
coisas mudem. Os partidos não
existem porque não existe um sistema moderno de sufrágio. Não
existindo os partidos, não pode
existir fidelidade partidária, não se
pode ser fiel ao que não existe. Mas
se quer uma lei que obrigue a fidelidade partidária. Acabe-se com o
voto proporcional que não precisa
de lei para fidelidade, porque os
partidos vão existir e quem sair do
partido não se elegerá mais.
É esse sistema eleitoral o responsável pela corrupção, pela degradação dos costumes políticos,
pelo abuso do poder econômico e
por todas as mazelas que existem
na política nacional.
Os homens podem corromper as
instituições, mas podres instituições dificilmente criam bons
frutos.
jose-sarney@uol.com.br
JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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