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CLÓVIS ROSSI
A última rendição
FILADÉLFIA - Ao tratar o Fórum Social Mundial como uma "feira ideológica", o presidente Luiz Inácio Lula
da Silva comete o último desembarque das posições que ele e seu partido
defenderam durante toda a vida. Ou,
posto de outra forma, Lula passou 23
anos (tempo de vida do partido antes
da vitória de 2002) completamente
equivocado, como vem confessando
dia sim, outro também.
É até verdade que o Fórum Social
Mundial é uma "feira ideológica".
Mas sempre foi assim, o que não impediu Lula e o PT de dele participarem não só ativamente como com o
maior orgulho.
Não há, aliás, nada de errado em
uma "feira ideológica". Ao contrário.
É extremamente saudável debater
idéias, em qualquer circunstância.
Mais saudável e oxigenante ainda a
partir do momento em que se impôs
no mundo a ditadura do chamado
"pensamento único", que limitava o
modo de governar a uma receita medíocre, cujos resultados só poderiam
ser, como têm sido, medíocres.
Lula tem até razão em propor que o
Fórum indique ações a serem desenvolvidas ao longo do ano. Neste mesmo espaço, mais de uma vez, já observei que o movimento que diz que
"outro mundo é possível" precisava
dar concretude às suas discussões,
sob pena de perder eternamente a
batalha ideológica porque o público
não-envolvido acabava ficando
alheio às propostas.
Mas o tema proposto pelo presidente (combate à fome) exemplifica o tamanho do desembarque de Lula das
ilusões. Ninguém é contra combater
a fome, como é óbvio. Mas aceitar esse objetivo como programa para "um
outro mundo é possível" é render-se
completamente à idéia de que não há
mais o que fazer a não ser oferecer as
famosas políticas compensatórias,
em vez da inclusão, como é o sonho
da "feira ideológica".
Ou, posto de outra forma, é aceitar
que não há outro mundo possível e,
portanto, para quem fica de fora, só
resta mesmo o sopão dos pobres.
Enfim, mais uma prova de que o
medo (de ousar pensar) venceu a esperança (de mudar).
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