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HÉLIO SCHWARTSMAN
Paradoxo democrático
SÃO PAULO - A três dias das eleições, é útil perguntar como votamos. Pela cartilha iluminista, analisamos as propostas de cada candidato, pesamos as que mais nos convêm e ao país e aí calculamos nosso
sufrágio. A democracia é boa porque é a expressão da vontade racional da maioria dos cidadãos.
No mundo real, as coisas são um
pouco mais complicadas. Ao que
tudo indica, o eleitor escolhe seus
representantes muito mais com o fígado do que com a cabeça.
Experimentos feitos pelo psicólogo Drew Westen mostraram que,
com base em rápidos questionários
sobre como uma pessoa se sente em
relação a certos temas (quase um
teste de personalidade), é possível
prever com 80% de precisão não só
como ela votará, mas também como responderá a perguntas bem específicas, como "o presidente mentiu ou disse a verdade?".
A crer nesse modelo neurocientífico, a escolha é, na maioria dos casos, feita com base nas emoções positivas ou negativas que cada um
dos postulantes, seus partidos e às
vezes também suas ideias despertam em nós. É só "a posteriori" que
arranjamos uma argumentação racional para justificar a decisão.
As implicações não são triviais.
Se o voto não é resultado de uma escolha racional e ponderada do cidadão, a ideia da democracia representativa ainda para em pé?
Apesar de as democracias modernas terem sido concebidas por
filósofos iluministas segundo uma
concepção de razão que hoje sabemos errada, o fato é que há mais de
200 anos elas vêm se revelando um
sistema funcional, capaz na maioria das vezes de autocorrigir-se.
Eleições normalmente se polarizam em dois campos, cujos militantes mais exaltados se anulam mutuamente. Acaba que os pleitos são
definidos pelos 20% mais moderados -o que não deixa de ser uma
virtude do sistema. De tempos em
tempos, em geral ciclos de 8 ou 12
anos, ocorre uma alternância, que
basta para manter os mais radicais
quietos, à espera da próxima vez.
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