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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Dínamo desconhecido
JURO MAIS baixo e moeda menos valorizada são condições
necessárias para que o Brasil
rompa a camisa-de-força que o impede de caminhar. Necessárias,
mas não suficientes.
Há dínamo secreto na economia
brasileira. Não é tema de nosso debate econômico. Transcorre o debate como se fôssemos qualquer
outro país que também sofra de juro alto: a Turquia, por exemplo. E
oscila entre duas posições desacreditas no resto do mundo: o financismo, disposto a sacrificar a economia real à confiança financeira,
e o keynesianismo vulgar, crente
de que, para regressarmos ao paraíso perdido do crescimento, basta que o Estado e os consumidores
gastem mais.
Traço marcante de nossa economia é sua extraordinária fragmentação. Comparado o Brasil com outros países em nível semelhante de
desenvolvimento, logo ressalta o
predomínio extremado entre nós
de empreendimentos de pequena
escala. Costumam operar na fronteira entre a legalidade e a ilegalidade, entre o emprego regularizado e o trabalho informal. Por carecer de acesso a crédito, a tecnologia, a conhecimento e a instrumentos para vencer as desvantagens da
pequena escala (como seriam os
mutirões de produtores para competir e cooperar ao mesmo tempo),
ficam relegadas à periferia amorfa
e desequipada de nossa economia.
Respondem, contudo, pela vasta
maioria dos empregos. E fervilham
de energia, com pendor para o improviso engenhoso e ousado, que
seria, se tivessem meios, a alavanca
de grande reviravolta econômica.
Essa realidade econômica tem
lado social. Ela representa o campo
de uma classe média emergente,
vinda de baixo e dedicada à cultura
da auto-ajuda e da iniciativa, que
está transformando, silenciosamente, o Brasil. Classe média que,
indiferente aos preconceitos da direita e da esquerda, já virou a vanguarda que a maioria dos brasileiros quer seguir. Se o governo provê-la das oportunidades que lhe
faltam, ele realizará, de uma só vez,
revolução econômica e revolução
social.
Essas duas revoluções conjugadas virão ao encontro de grande
mudança no mundo. A produção
padronizada, rígida e burra declina. A produção não-padronizada,
flexível e inteligente ascende. Resta saber se as novas práticas do experimentalismo produtivo irão expandir-se por larga parte de cada
economia nacional ou ficar restritas a setores elitizados.
Temos condições únicas para
andar na frente dessa transformação mundial. Para isso, porém, falta-nos realismo, porque nos falta
imaginação.
www.law.harvard.edu/unger
ROBERTO MANGABEIRA UNGER escreve às terças-feiras nesta coluna.
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