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TENDÊNCIAS/DEBATES
NÃO
Parceiros estratégicos?
ERIC FARNSWORTH
A VISITA do presidente do Irã ao
Brasil levou vários observadores a questionar se a conversa
sobre a parceria estratégica entre
Brasil e EUA na conduta dos assuntos
hemisféricos -na verdade, globais-
não passaria de algo que se deseja,
mas que, concretamente, não existe.
Provavelmente não há nenhuma
questão internacional de importância
maior, na visão coletiva de Washington, que os assuntos do Oriente Médio. Entre estes, uma ameaça nuclear
iraniana emergente é vista como
"existencial" -ou seja, virtualmente,
tudo o que pode ser feito será considerado no esforço para limitar as ambições nucleares iranianas.
Nesse contexto, a visita de Mahmoud Ahmadinejad ao Brasil tocou
uma nota alta e dissonante. Ao dar as
boas-vindas ao líder do Irã, o Brasil
proporcionou farta dose de oxigênio
aos esforços iranianos para passar
por cima do seu crescente isolamento
internacional.
Sejam quais forem as
justificativas do convite, a impressão
deixada pela visita foi a de que a posição iraniana foi reforçada pela acolhida calorosa que Ahmadinejad teve.
Esse fato foi notado em Washington e em outras capitais ocidentais,
mas não necessariamente como alguns setores poderiam ter previsto.
O fato é que os dois países são soberanos. Seus líderes podem reunir-se
com quem bem entenderem. A questão não é essa. A questão é sobretudo
a seguinte: em vista da crescente influência internacional do Brasil e de
seu desejo apropriado de exercer um
papel maior no palco mundial, com
que finalidades o país vai fazer uso
dessa posição emergente?
Com isso
em mente, é possível que prevaleça
uma parceria real com os EUA?
A meu ver, a resposta é "sim". O "timing" da visita do líder iraniano foi
infeliz, de fato, e até mesmo desavisado. Entretanto, desde que seja um
episódio que não se repita, as áreas de
cooperação e colaboração entre Brasil e EUA têm peso muito maior.
Desde questões hemisféricas, como
as operações conjuntas de manutenção da paz no Haiti, até questões globais, como energia e mudanças climáticas, a agenda é ampla e profunda. E
ela deve continuar a ser priorizada
pelos dois governos.
O êxito, contudo, vai depender de
um ponto fundamental. Para os EUA,
precisamos aceitar a proeminência
crescente do Brasil e procurar ativamente construir um relacionamento
que leve em conta seus interesses legítimos de segurança e econômicos.
Para o Brasil, a cooperação precisa ser
vista como mutuamente recompensatória, e não como uma questão de
"ou um, ou outro". Em outras palavras, a ascensão do Brasil não precisa
ser vista como algo que terá que acontecer às expensas dos EUA.
As questões com as quais os dois
países se defrontam são formidáveis e
não podem ser enfrentadas por nenhum deles sozinho. As mudanças
climáticas são um exemplo. Os Estados Unidos são o maior consumidor
de energia do mundo.
As necessidades energéticas do Brasil estão crescendo, o país já possui uma matriz
energética substancialmente "limpa"
e é um líder mundial em fontes energéticas alternativas. Ao mesmo tempo, o Brasil tem um papel de grande
importância a exercer na proteção da
Amazônia, cujo desmatamento já é,
na realidade, um problema global.
Com certeza os dois países podem
e, de fato, precisam encontrar maneiras de trabalhar juntos nas reuniões
de Copenhague -e além dela- para
forjar um consenso global em torno
desses problemas muito difíceis.
Também as questões comerciais
globais pedem uma abordagem colaborativa entre EUA e Brasil. O programa americano de subsídios e apoio
agrícolas com certeza é equivocado,
mas uma das maneiras mais certeiras
de desmontá-lo é com a colaboração
de ambos os países para levar a Rodada Doha a uma conclusão exitosa.
Em última análise, o imperativo da
cooperação entre Brasil e Estados
Unidos em torno de muitas questões
críticas é urgente. Desde que seja minimizado o impacto da visita recente
do líder iraniano, o futuro das relações bilaterais será promissor.
ERIC FARNSWORTH, mestre em relações internacionais,
é vice-presidente do Conselho das Américas, em Washington. É ex-funcionário do Departamento de Estado dos
EUA e trabalhou na Casa Branca como assessor político
sênior para Assuntos Hemisféricos (1995-1998).
Tradução de Clara Allain.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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