São Paulo, quarta-feira, 28 de dezembro de 2005 |
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Parabolicamará sem rumo
MARCO VILLA
Para que tantas viagens? Como são selecionadas as atividades? O que fica de permanente nesses eventos, além de fortalecer a imagem musical de Gil? O poeta, jornalista e chefe da assessoria de Comunicação Social do MinC (é dessa forma que ele se apresenta), Luís Turiba, transformou o site do ministério em um instrumento de culto da personalidade do ministro. Cita Gil a todo momento e dá aos seus artigos títulos das músicas do cantor. Sobre a ida do ministro à ONU, fez uma entusiasmada reportagem. Chamou de "Um furacão na ONU". Gil "transformou o austero e sóbrio plenário da ONU, onde as maiores e mais dramáticas decisões da política mundial são tomadas, em uma espécie de praça Castro Alves durante o carnaval baiano". Continuou, eufórico, o relato: ele cantou 16 músicas em quatro línguas, deu sete recados pacifistas e "trocou carícias verbais com Mohamed Ali". O ministro-cantor encerrou o ato em homenagem a Sérgio Vieira de Mello, morto em um atentado terrorista no Iraque -disso é importante lembrar, pois o leitor pode imaginar que era uma festa junina-, com um discurso: "O que nós temos a dizer ao mundo hoje é que o Brasil está limpo. O Brasil é claro. O Brasil é afiado. O Brasil é inteiro". E concluiu com uma saudação: "E viva Luiz Gonzaga, o rei do baião!". Dessa vez, Turiba não exagerou: foi literalmente um furacão. Porém, de política cultural, nada. Gilberto Gil não é nenhum ingênuo. Manteve-se três anos no ministério em meio a diversas crises. Foram apresentadas sérias denúncias em relação aos projetos culturais desenvolvidos pelo MinC, mas tudo ou caiu no esquecimento ou teve a culpa imputada ao secretário-geral do ministério -recorde-se de que o ministro se ausentou sistematicamente de Brasília: em 2005, o primeiro despacho, segundo sua agenda, foi em 16 de março. Fingiu que não viu a greve dos funcionários -e foram cem dias de paralisação; em maio, no momento em que o PV rompeu com o governo, fez de conta que não era do partido, mas se lembrou de pedir apoio à bancada petista da Assembléia carioca, e, no mês seguinte, disse que defendia o presidente "com unhas e dentes", no auge da crise do "mensalão". Mas, sobre o roubo de mil imagens raríssimas da Biblioteca Nacional, o país até agora não sabe quais as providências tomadas. Tanto Paulo Autran como Marco Nanini têm razão nas suas críticas à ação do Ministério da Cultura. Antonio Grassi, presidente da Funarte, neste espaço, afirmou que o ministro estabeleceu como meta obter para o ministério 1% de recursos do Orçamento: em três anos, esteve longe da meta. Lista programas que devem ser realizados. Fala em obter, por emenda parlamentar, R$ 100 milhões para 2006 -entretanto o recurso dificilmente será liberado, como o de tantas outras emendas. Mesmo assim, escreveu que, "pela primeira vez na história do país, o governo tem uma política para o desenvolvimento do setor". É outra característica de governo: tudo na gestão Lula é feito pela primeira vez, como se existisse um país pré e outro pós-Lula. Lamentavelmente, o MinC não tem um projeto de política cultural para o país. Tem, sim, um projeto pessoal, que está dando certo, muito certo. Marco Antonio Villa, 49, é professor de história da Universidade Federal de São Carlos (SP) e autor de, entre outras obras, "Vida e Morte no Sertão: História das Secas no Nordeste nos Séculos 19 e 20" (Ática). Texto Anterior: TENDÊNCIA/DEBATES Joseph E. Stiglitz: Ação brasileira gera importante avanço Próximo Texto: Painel do Leitor Índice |
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