São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

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Fronteira esquecida

Ataque a brasileiros no Suriname chama atenção para emigrados que atuam em região com parca presença estatal

O ATAQUE , na noite de Natal, contra um grupo de garimpeiros brasileiros no Suriname chamou as atenções nacionais para uma região de fronteira e uma significativa população de emigrados que vêm sendo negligenciadas pela sociedade e pelo governo brasileiros.
O estopim da violência, segundo relatos, foi o assassinato de um surinamês, atribuído a um brasileiro que lhe devia dinheiro. Dezenas de compatriotas cercaram um acampamento na cidade de Albina, junto à fronteira com a Guiana Francesa, onde moram cerca de 80 brasileiros, e agrediram homens, mulheres e crianças a golpes de facão.
Eram imprecisas, até a noite de ontem, as informações sobre o número de feridos durante a investida de descendentes de quilombolas locais contra os brasileiros. Por não haver confirmação de mortos entre os garimpeiros atacados, o embaixador José Luiz Machado e Costa relatou como "tranquilizadora" a visita que fez, ontem, a Albina.
Ele já havia afirmado que "alguma tensão" em relação aos brasileiros pode advir da situação irregular de muitos deles, "vistos como pessoas que usufruem dos serviços públicos sem pagar nada por eles".
Sabe-se ainda que, desde os anos 90, aumentou o fluxo de pessoas oriundas do Norte e do Nordeste do país para o Suriname, migração intensificada após o estabelecimento de vigilância mais rigorosa pela Guiana Francesa em suas fronteiras.
Garimpeiros, geralmente ilegais, têm se estabelecido na região limítrofe do Suriname com a Guiana Francesa para explorar ouro nos dois territórios. Estima-se entre 15 mil e 18 mil os brasileiros no Suriname, cuja população é de 480 mil pessoas.
No sentido inverso, inquéritos sobre o tráfico de armas para o Brasil apontam a ex-colônia holandesa, independente desde 1975, mas ainda com acesso facilitado a portos europeus, como entreposto na entrada ilegal de armamentos em nosso país.
Se as fronteiras entre as Guianas, o Suriname e o Brasil contam com parca presença do Estado, a situação parece ainda mais grave na região leste da ex-colônia holandesa. Grupos locais de descendentes de escravos formaram milícias que combateram o governo no início dos anos 90. Foram pacificados, mas a presença de policiais, militares ou funcionários públicos ainda é escassa na fronteira com a Guiana Francesa.
Não será tarefa fácil, nem exclusiva do Brasil, controlar melhor os fluxos de pessoas, de armas e de ouro na região, convergência que fatalmente gera situações de conflito.
O Estado brasileiro ainda tem muito o que avançar na sua relação com emigrados, que em geral contam com pouco apoio do serviço diplomático. É preciso acompanhar melhor essas populações, prestar assistência quando necessário e coordenar esforços com governos estrangeiros a fim de legalizar a situação de brasileiros que vivem irregularmente no exterior.


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