São Paulo, domingo, 29 de fevereiro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

A difícil arte de governar

O debate sobre moral, ética e política sempre ocupou um lugar de destaque nas lições dos filósofos e historiadores. Não é preciso dizer que o tema é dos mais controvertidos. Muitos argumentam que o governante nem sempre pode dizer a verdade, em especial nos campos da economia e da segurança. Assim como o governo está impedido de anunciar uma desvalorização cambial, está bloqueado para revelar seus planos de segurança.
Mas, se tais exemplos são verdadeiros, eles não podem ser generalizados para toda e qualquer ação do governo. Na administração dos recursos públicos, assim como na busca do poder, o povo tem o direito de exigir condutas retas e transparentes dos governantes, nada justificando manobras diversionistas que visem deslocar sua atenção.
O Brasil vive momentaneamente uma crise de confiança. O povo votou na esperança de ver concretizados os planos de justiça social longamente pregados por quem sempre elevou a ética e a moral acima de qualquer outra virtude.
Se isso ruir, ruirá a esperança. Mas desanimar não faz parte do vocabulário do brasileiro. Por outro lado, é importante considerar que confiança depende mais de exemplos do que de pregação. Se o vaso foi trincado, é preciso reconstruí-lo, punindo com firmeza quem abusou da intimidade dos governantes e afastando, uma vez comprovado, os que agiram como cúmplices.
Isso é absolutamente essencial para recuperar a credibilidade, que, no momento, é um ingrediente essencial para a realização do desenvolvimento econômico, social e político da nossa nação. Nesse campo, não há lugar para acomodações. O que deve pairar sobre tudo é a efetividade das instituições, em especial da Justiça.
O Brasil não é o único a ser atacado por surtos de desconfiança. No mundo desenvolvido, não faltam exemplos de governantes que mentiram aos governados, causando estragos nas finanças públicas e corroendo o respeito nacional. Lá, como aqui, a confiança só volta quando as instituições democráticas identificam e punem os infratores, evitando que a nação entre pelo descaminho dos doentes desenganados.
Felizmente, o Brasil possui instituições que se prezam, assim como dispõe de um bom número de governantes que respeitam os valores da moral e da ética. No âmbito de São Paulo, presto aqui uma homenagem aos últimos governadores que administraram e vem administrando o Estado com seriedade e correção, dando um belo exemplo ao restante da nação.
Não seria bom que tais condutas pudessem ser generalizadas? E que os tribunais não precisassem intervir para apurar irregularidades?
É claro que sim. Mas melhor ainda é deixar a Justiça livre para que os tribunais possam agir quando necessário. Penso que a confiança não foi perdida, mas que precisa ser urgentemente restaurada.


Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Corpo de delito
Próximo Texto: Frases

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.