São Paulo, terça-feira, 29 de abril de 2008

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MARCOS NOBRE

Gincana de arraial

OS DOIS PARTIDOS que polarizam a política brasileira, PT e PSDB, são dirigidos desde São Paulo. Os últimos acontecimentos mostram que a briga para manter essa liderança já virou mesmo disputa de bairro.
O PT não tem uma candidatura forte para 2010, muito menos uma candidatura paulista viável. Essa perspectiva ameaça não apenas sua liderança do bloco governista, mas a hegemonia histórica de São Paulo dentro do próprio PT.
Não tendo mais Lula como candidato, a direção paulista do PT aposta na divisão para manter pelo menos o controle do partido. Em Belo Horizonte, melou a aliança entre Fernando Pimentel e Aécio Neves. A idéia de enfraquecer Pimentel e de abrir espaço para Patrus Ananias e Luiz Dulci serve para manter dividido o PT mineiro, o que hoje é o mesmo que não fortalecer Aécio.
Nisso fecha com José Serra, que fez a outra metade do serviço. Serra conseguiu implantar o novo PFL em São Paulo e colocou Orestes Quércia de volta ao jogo. Em resposta às articulações de Aécio, Serra isolou Geraldo Alckmin, momentaneamente forçado a uma aliança com o mineiro dentro do PSDB. De quebra, o acordo com Quércia colocou um obstáculo importante a uma possível transferência de Aécio para o PMDB.
Foi aliás Quércia quem expressou de maneira mais clara a frente ampla do bairro paulista. Ao sacramentar a aliança com Gilberto Kassab, declarou que "analisaria o apoio de todo o PMDB a Serra. Seria a primeira vez, depois de cento e tantos anos, que São Paulo elege um presidente. O último presidente que nasceu em São Paulo, paulista, foi Rodrigues Alves, se não me engano".
O eventual engano não está no bairro de origem do presidente, mas na lógica de paróquia que guia as articulações políticas. Porque o bairrismo político está hoje por toda parte.
A frente ampla do bairro mineiro em torno de Aécio existe há já algum tempo, sem ter demonstrado até agora qualquer consistência política ou ideológica visível. O que Aécio conseguiu foi canalizar a insatisfação geral dos políticos contra São Paulo, que vem já desde pelo menos o governo Collor. A novidade é que esse fenômeno, antes de superfície, passou agora de fato a determinar de maneira profunda a movimentação política.
Quando a política se reduz a uma competição entre bairros, a mediocridade já ganhou, seja qual for o resultado. A última disputa realmente relevante da política brasileira se deu em torno da CPMF. Depois disso, só mesquinharia. Dá medo pensar que essa gincana de arraial talvez não seja o nível mais baixo a que se pode chegar.


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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