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CARLOS HEITOR CONY
Ser ou não ser - eis a questão
RIO DE JANEIRO - Sinceramente, não entendi a necessidade da reconstituição do assassinato da menina Isabella. Os advogados dos
dois indiciados conseguiram evitar
que o pai e a madrasta confirmassem, na cena do crime, as alegações
que até aqui haviam prestado nos
vários depoimentos aos delegados.
A reconstituição foi feita com dublês.
Convém lembrar que a primeira
reconstituição de um crime não foi
feita pela polícia. Foi feita num palco, numa peça de Shakespeare. Avisado pelo fantasma do pai, no castelo de Elsinore, de que a mãe e o padrasto de Hamlet o haviam assassinado, "o doce príncipe" contratou
artistas profissionais para encenar
uma peça fictícia na qual haveria
um crime igual ao que matara o pai.
As dúvidas -se é que as tinha- se
dissiparam. Pelas reações da mãe e
do padrasto durante o espetáculo,
Hamlet teve a certeza que o fantasma de seu pai dissera a verdade.
A partir de Shakespeare, o recurso da reconstituição de um crime
foi usado e sempre serviu para elucidar casos complicados, em que
não houve flagrante nem confissão
do criminoso. É um desafio psicológico e mecânico, os suspeitos geralmente se atrapalham na hora de
confirmar os movimentos que alegaram em sua defesa, sempre cometem uma contradição fatal.
E há também o efeito psicológico,
que não pode ser desprezado numa
investigação criminal. Por isso
mesmo os advogados que defendem o casal já indiciado conseguiram livrar seus clientes da prova de
fogo. O espetáculo promovido anteontem foi espalhafatoso e, qualquer que seja a conclusão dos peritos, na hora do júri haverá sempre a
hipótese de tudo ter sido montado
pela própria polícia -um argumento que poderá balançar a decisão
dos jurados, abrindo caminho para
infindáveis recursos.
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