São Paulo, terça-feira, 29 de abril de 2008

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CARLOS HEITOR CONY

Ser ou não ser - eis a questão

RIO DE JANEIRO - Sinceramente, não entendi a necessidade da reconstituição do assassinato da menina Isabella. Os advogados dos dois indiciados conseguiram evitar que o pai e a madrasta confirmassem, na cena do crime, as alegações que até aqui haviam prestado nos vários depoimentos aos delegados. A reconstituição foi feita com dublês.
Convém lembrar que a primeira reconstituição de um crime não foi feita pela polícia. Foi feita num palco, numa peça de Shakespeare. Avisado pelo fantasma do pai, no castelo de Elsinore, de que a mãe e o padrasto de Hamlet o haviam assassinado, "o doce príncipe" contratou artistas profissionais para encenar uma peça fictícia na qual haveria um crime igual ao que matara o pai.
As dúvidas -se é que as tinha- se dissiparam. Pelas reações da mãe e do padrasto durante o espetáculo, Hamlet teve a certeza que o fantasma de seu pai dissera a verdade.
A partir de Shakespeare, o recurso da reconstituição de um crime foi usado e sempre serviu para elucidar casos complicados, em que não houve flagrante nem confissão do criminoso. É um desafio psicológico e mecânico, os suspeitos geralmente se atrapalham na hora de confirmar os movimentos que alegaram em sua defesa, sempre cometem uma contradição fatal.
E há também o efeito psicológico, que não pode ser desprezado numa investigação criminal. Por isso mesmo os advogados que defendem o casal já indiciado conseguiram livrar seus clientes da prova de fogo. O espetáculo promovido anteontem foi espalhafatoso e, qualquer que seja a conclusão dos peritos, na hora do júri haverá sempre a hipótese de tudo ter sido montado pela própria polícia -um argumento que poderá balançar a decisão dos jurados, abrindo caminho para infindáveis recursos.


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