São Paulo, quarta-feira, 29 de abril de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Liberdade tarifária

RONALDO SEROA DA MOTTA, MARCELO PACHECO DOS GUARANYS e JULIANO ALCÂNTARA NOMAN

Permitir que as empresas aéreas reduzam preços e possam, assim, estimular a demanda por seus serviços é salutar para todos


JÁ EM vigor para a América do Sul, a liberdade tarifária agora está sendo ampliada gradualmente pela Agência Nacional de Aviação Civil para todos os voos internacionais. A existência de um preço mínimo nas passagens vendidas no Brasil, impedindo os descontos, valia como um imposto ao brasileiro em viagem ao exterior. Com a nova medida da Anac, esse preço mínimo fica reduzido em 20%, caindo para 50% e 80%, respectivamente, em três e seis meses, com sua eliminação total em 12 meses.
A liberdade tarifária já era prevista em 2005, no artigo 49 da lei 11.182, que criou a Anac, e foi confirmada na Política Nacional de Aviação Civil, assinada pelo presidente Lula, que explicita claramente a necessidade de delegar ao mercado o papel de equilibrar oferta e demanda. Ressalte-se que as empresas brasileiras já convivem com a liberdade tarifária nos mercados internacionais em que atuam, demonstrando capacidade de competição e expansão de seus serviços, e que os prazos propostos pela Anac são adequados para a adaptação operacional de nossas empresas às mudanças.
A proposta foi debatida em consulta e audiência pública ao longo de oito meses. A Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, o Ministério Público Federal e entidades de defesa do consumidor se manifestaram a favor da liberalização, alguns inclusive sugerindo prazos ainda menores. Porém, o Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (SNEA) e sua principal associada, a TAM, são contra a medida, argumentando que as companhias brasileiras ficariam em desvantagem diante das concorrentes estrangeiras.
A medida da Anac é oportuna na atual crise econômica, que tende a reduzir a demanda por voos internacionais. Nesse cenário, as empresas têm duas opções de ajuste: reduzir a oferta de voos ou cortar preços. A primeira alternativa tem impactos negativos nos consumidores, além de afetar empregos. Permitir que as empresas reduzam preços e possam, assim, estimular a demanda por seus serviços é salutar para todos -companhias aéreas e consumidores.
Por outro lado, a Anac não vê sustentação na tese da "fragilidade" das empresas nacionais diante das concorrentes estrangeiras. E seus defensores tampouco apresentaram argumentos técnicos convincentes. Os preços do combustível e das tarifas aeroportuárias e aeronáuticas, que representam quase 40% dos custos operacionais, demonstram isso.
O custo de abastecimento no Brasil é maior do que em outros países, mas é cobrado de forma igual tanto para empresas brasileiras quanto para estrangeiras. Da mesma forma, as companhias brasileiras se beneficiam do custo mais baixo à disposição de suas concorrentes em seus países de origem. O mesmo vale para as tarifas aeroportuárias.
Dados do próprio SNEA sobre os custos das estrangeiras depõem contra os argumentos da entidade. Além do combustível, outros 15% dos custos operacionais seriam iguais tanto para as empresas nacionais quanto para as estrangeiras. Já com relação aos gastos com manutenção e arrendamento (cerca de 22% dos custos), eles são menores para as empresas estrangeiras. Em compensação, os custos de mão de obra, que respondem por outros 22% do total, são mais baratos no Brasil.
Ainda na comparação de custos operacionais, sabe-se que a carga tributária média do Brasil é elevada. Por outro lado, o setor de serviços aéreos nacional goza de diversos benefícios fiscais -por exemplo, não paga imposto de importação de aeronaves- que suas concorrentes não encontram em seus países de origem.
Fica claro que empresas nacionais e estrangeiras apresentam condições equivalentes para competir e, portanto, não há necessidade de medidas protecionistas -nem sequer cabe à Anac impor esse tipo de medida, pois sua missão regulatória não lhe confere esse poder. Por fim, a Anac levou em consideração em seus estudos um fato inegável.
Um país com um grande mercado doméstico como o Brasil, mercado esse que é reservado para as empresas brasileiras, sempre terá escala que lhe trará vantagens competitivas na área internacional -desde que prevaleça um ambiente regulatório sustentável, no qual os usuários tenham diversidade de escolha, e as empresas, a liberdade de reduzir preços.

RONALDO SEROA DA MOTTA, 55, graduado em engenharia de produção e doutor em economia pela University of London (Inglaterra), é diretor da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).
MARCELO PACHECO DOS GUARANYS, 31, graduado em direito e em economia, é diretor da Anac.
JULIANO ALCÂNTARA NOMAN, 33, graduado em economia, é superintendente de Serviços Aéreos da Anac.


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