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Planejamento familiar
Programa que distribui mais contraceptivos é positivo, mas controle da gestão do sistema pela Saúde precisa melhorar
O PRESIDENTE Luiz Inácio Lula da Silva apresentou ontem um novo programa de planejamento familiar que prevê, entre outras medidas, a venda de
anticoncepcionais com 90% de
desconto em farmácias credenciadas e o aumento da oferta de
contraceptivos gratuitos em postos de saúde.
A iniciativa é oportuna. O país
talvez enfrentasse hoje menos
problemas se tivesse sido mais
atento ao problema demográfico
no passado. Não parece despropositado relacionar a explosão
da violência urbana, a favelização das grandes cidades e outros
sintomas do mal-estar social
brasileiro, que se acentuaram
nos últimos 20 anos, à negligência pretérita das autoridades.
A mentalidade dos militares,
que pregavam no poder a ocupação dos vazios demográficos, foi,
ao lado da posição histórica da
Igreja Católica a respeito dos
métodos contraceptivos, um poderoso inibidor de um debate
que sem dúvida faltou ao país.
Hoje, a ameaça de uma nova
explosão populacional não se coloca, mas o planejamento ainda é
importante por permitir que as
pessoas exerçam sua sexualidade de forma responsável e sadia.
As altas taxas de fecundidade
da mulher brasileira caíram em
ritmo quase sem paralelo no
mundo. Em 1970, o índice era de
5,8 filhos por representante do
sexo feminino. Em 1980, acompanhando o rápido processo de
urbanização, caiu para 4,4 e, em
1991, o Censo registrou 2,7 descendentes por brasileira. Em
2000, a taxa já baixara para 2,4 e,
em 2004, à marca dos 2,1 filhos
por mulher, que é a taxa de reposição -isto é, crescimento zero.
Mas há motivos para inquietação. Mulheres pobres e sem instrução ainda têm muito mais filhos do que as de maior renda e
escolaridade. Este segue sendo
um poderoso mecanismo de reprodução da miséria.
A receita para combatê-lo é conhecida: informação e acesso aos
meios contraceptivos. É justamente isso que o novo programa
do Ministério da Saúde pretende
proporcionar. Além da ampliação da oferta de métodos anticoncepcionais dentro e fora do
SUS -um investimento orçado
em R$ 100 milhões-, estão previstas campanhas sobre o tema.
São passos importantes, mas
insuficientes. É preciso -e com
urgência- tornar a gestão do sistema mais eficaz. Estudo do
Centro de Pesquisas em Saúde
Reprodutiva de Campinas (Cemicamp), publicado em novembro de 2006, revela um quadro
desolador. O ministério adquire
kits com métodos anticoncepcionais e os envia às Secretarias
Municipais de Saúde. Nessa primeira etapa, as coisas funcionam. Apenas 4% das secretarias
deixaram de recebê-los.
O problema piora no trânsito
para as Unidades Básicas de Saúde (UBS), onde o usuário é atendido. A proporção de UBS que
não recebem os contraceptivos
sobe para 17%, e chega a 92% no
caso de kits com métodos de
aplicação mais sofisticada, como
DIU e hormônio injetável.
Sem melhorar a gestão, boas
iniciativas serão comprometidas
pelo desperdício de recursos.
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