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CLÓVIS ROSSI
A pouca-vergonha
SÃO PAULO - Escrevo antes de saber o resultado do segundo turno da eleição na Câmara dos Deputados, mas,
seja qual for, você diria que a honra
da Casa foi restaurada?
Ou diria que foi um festival de avacalhações, a começar da frenética
busca de apoio do Partido Liberal por
parte do comunista Aldo Rebelo? Só
no Brasil pode acontecer esse tipo insólito de casamento: liberais e comunistas, ambos completamente à vontade na pouca-vergonha.
Se fosse só esse o pecado, seria mais
uma aberração que passa por normal no pobre país tupiniquim. Mas
há ainda o fato de um dos envolvidos
nesse casamento chamar-se Valdemar Costa Neto, o presidente do PL
que renunciou para não ser cassado
por falta de decoro, depois de confessar recebimento de "dinheiro não-contabilizado" (o neologismo dos
sem-vergonha para caixa dois).
Mas Rebelo está justificado porque
Ricardo Berzoini, o mais votado candidato a presidente do PT, diz que
caixa dois "não é corrupção".
O rapaz só concorre à presidência
do PT porque a direção anterior e
mais uma penca de deputados foram
pilhados no caixa dois. Se não é corrupção, por que não mantê-los no comando? Já têm uma imensa "expertise" acumulada.
Só falta Berzoini dizer que sonegação fiscal (uma das utilidades do caixa dois) também não é corrupção.
Como se fosse pouco, o leitor Rubens Gatto pescou um ato falho do
ex-ministro José Dirceu em seu depoimento ao Conselho de Ética na
terça-feira. Disse Dirceu: "Volto ao
Conselho de Ética (...) cada vez mais
convencido da minha inocência".
Cada vez mais? Quer dizer que, no
início do caso, não estava convencido e que vai se convencendo da inocência aos poucos, de tanto repetir
para si mesmo que é inocente?
Se ele próprio tinha dúvidas sobre
sua inocência, como é que o distinto
público pode acreditar nela?
@ - crossi@uol.com.br
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