São Paulo, quinta-feira, 29 de setembro de 2005

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VACAS NA METRÓPOLE

A s intervenções urbanas propostas por artistas costumam pautar-se por princípios de difícil compreensão pelo grande público. Tome-se a marquise na praça do Patriarca, na capital paulista. Mesmo passados mais de três anos de sua instalação, ainda há quem reaja com estranhamento e ignore sua função.
O mérito da "CowParade" -conjunto de 150 vacas de fibra de vidro espalhadas desde setembro pela cidade- reside justamente em sua despretensão. É comum ver crianças se divertindo com as intervenções, turistas fotografando-as e mesmo moradores que percorrem a cidade para conhecê-las.
Parte de um circuito que inclui outras cidades do mundo, a iniciativa mistura-se com a publicidade: cada objeto tem um patrocinador e é decorado por um artista diferente. Na avenida Paulista, por exemplo, há uma vaca representada com termômetro na boca que é patrocinada por um remédio contra a gripe.
Não se trata, naturalmente, de enaltecer o potencial artístico da "CowParade". Há nas decorações um evidente aspecto "kitsch" que parece ecoar uma vertente pouco profícua da arte contemporânea. Também não há como negar que estão expostas nos locais mais nobres da capital e que ignoram a periferia mais populosa. Mas a proposta não é discutir os significados a fundo ou renovar a idéia de "arte pública". Trata-se apenas de fortalecer, ainda que de maneira inusitada e gratuita, os laços dos transeuntes com uma cidade carente de marcos afetivos.
Em um ambiente urbano hostil, que normalmente não chama a atenção dos cidadãos -pelo contrário, gera repulsa-, as simpáticas vacas contribuem para propagar um sentimento lúdico e desinteressado que merece ser visto com bons olhos.


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