São Paulo, quinta-feira, 29 de setembro de 2005

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CARLOS HEITOR CONY

O verbalão

RIO DE JANEIRO - Quando afirmo e reafirmo que nada entendo de política -nem pretendo entender-, alguns leitores pensam que é uma tentativa de charme do cronista, ou deslavada insinceridade. Nem tanto, nem tanto.
Há meses, os corifeus na mídia e a classe política como um todo, nos botecos e velórios dos tempos do Nelson Rodrigues, só falam em "mensalões" e "mensalinhos". Mais emocionante do que uma corrida da Fórmula 1 é a disputa que consagrará na pole position os mais indignados, os mais enojados, os mais repugnados, os mais republicanos, os mais transparentes.
Para não ficar atrás dos valérios e delúbios, vem agora o governo inaugurar um ramal que não chega a ser novo, pelo contrário, é mais antigo e habitual do que qualquer "mensalão" ou "mensalinho". É o verbalão. Em termos quantitativos, dá um banho nos R$ 7.500 recebidos pelo Severino. São milhões para convencer os ainda não convencidos a votar no candidato do governo para a presidência da Câmara dos Deputados.
Ora, direis, ouvir estrelas e o bom senso. Em tese, o verbalão não se destina ao bolso dos deputados, mas a obras que aumentarão o cacife dos candidatos que enfrentarão o eleitorado daqui a um ano para a renovação dos mandatos.
Parte dos "mensalões" e "mensalinhos" também teve motivação mais ou menos igual, lubrificava ou pagava dívidas de campanhas antigas e futuras. O conteúdo e a forma do suborno são os mesmos, variando apenas a escala e o propósito.
A escala, como foi dito acima, é formidavelmente maior quando o corruptor é o próprio governo, que usa dinheiro que não é dele para convencer os deputados -prática que também foi adotada por FHC no episódio de sua reeleição e das privatizações durante seu governo.
O propósito é igualmente nefasto. O governo tenta corromper a Câmara para fazer do Legislativo uma vaquinha de presépio capaz de ajudar o PT a permanecer no poder os pretendidos 20 anos.


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