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Farsa parlamentar
Demagógicos e oportunistas, deputados e senadores mudam de atitude sobre a CPMF conforme a ocasião
TODO MUNDO sabe, declarou recentemente o presidente Lula, que o governo federal não pode
abrir mão dos R$ 40 bilhões da
CPMF. Seu diagnóstico é correto
e pode ser chancelado por qualquer político oposicionista que
aspire à sucessão presidencial
em 2010.
A característica franqueza do
pronunciamento presidencial
não elimina, por certo, o quanto
há de emergência e de improviso
nas negociações em torno do tema. A complexa engenharia das
compensações que agora ocupa
governistas e peessedebistas no
Senado, em meio às premências
do calendário legislativo, poderia
sem dúvida ter sido evitada se
Congresso e Executivo tivessem
se empenhado na elaboração de
uma reforma tributária.
Dos tributos em vigor -contam-se às dezenas-, a CPMF
não é o mais perverso nem o
mais irracional. Com os necessários ajustes (que contemplem,
por exemplo, uma redução da
alíquota ao longo do tempo ou o
abatimento de outros impostos
mais nocivos à atividade econômica) e com o imprescindível
compromisso de reduzir os gastos públicos, sua aprovação pelo
Senado é sem dúvida a alternativa menos danosa de que se dispõe no horizonte imediato.
Tomou-se a questão da CPMF,
entretanto, como símbolo de todo o histórico de abusos e extorsões com que o Estado, há décadas, vitima a sociedade. "Todo
mundo sabe", para repetir a frase
de Lula, que a redução da carga
de impostos é prioritária para o
desenvolvimento do país.
O que "nem todo mundo sabe",
entretanto, é o grau de demagogia e de bravata que se abriga nas
discussões parlamentares em
torno da CPMF. Reportagem publicada pela Folha na última semana demonstra, num registro
quase cômico, a volatilidade de
atitudes de petistas, tucanos e
ex-pefelistas no tocante ao assunto, conforme a posição que
ocupavam na geografia do poder.
"A CPMF é um imposto cumulativo e ruim", disse o senador
Arthur Virgílio (PSDB-AM), em
maio deste ano. Durante o governo FHC, considerava essencial que o mesmo imposto fosse
aprovado "de maneira consagradora", em nome de "um projeto
e uma lógica". Esta, com certeza,
se perdeu; teve o mesmo fim que
a do deputado José Genoino
(PT-SP), que em 1999 estigmatizava a CPMF como "a anti-reforma fiscal e tributária" e hoje a
qualifica como "elemento importante do equilíbrio fiscal e do
ajuste do pacto federativo".
Num momento em que se comemoram, com exagero, as decisões do Judiciário em favor da fidelidade partidária, não deixa de
ser instrutivo o registro dessa
deprimente mascarada parlamentar. Nenhum participante
da farsa teve de mudar de partido para adaptar-se, digamos, às
novas realidades.
Mudar de idéia, dirão os mais
cínicos, é direito de todos. Seria
o caso de retrucar, todavia, que
assim como existe um imposto
para as movimentações financeiras, seria bem-vinda uma taxa
sobre as movimentações ideológicas dos legisladores brasileiros. O fisco não seria, sem dúvida, o único a agradecer.
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