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ALBA ZALUAR
Irresponsabilidade intelectual
Houve certo consenso entre intelectuais, artistas e estudantes enquanto tratava-se
de lutar contra o regime militar pelas idéias expressas em palavras.
Havia os que apostaram no barco
furado do confronto violento. Foi
mal.
Agora, não mais. As idéias expressas em palavras estão sendo
usadas por alguns para incitar jovens pobres (das favelas ou das periferias) a entrar na canoa ainda
mais furada do crime violento. Estes jovens estão morrendo como
moscas e enriquecendo quem quase não aparece nas notícias e nas
investigações policiais.
O jovem da periferia não é nem
nosso herói revolucionário (precisa ser muito ingênuo ou mal informado para afirmar isso) nem nosso
inimigo número um (precisa ser
muito preconceituoso ou mal informado para acreditar nisso). São
jovens em busca de identidades, de
motivos de orgulho masculino e de
meios de sobrevivência. Grande
número é morto antes de entender
porque a canoa virou.
É na região Sudeste, a mais populosa e rica região do território
nacional, que as mortes violentas
atingem a taxa mais alta entre os
jovens do sexo masculino, mantendo um aumento notável, desde
1980, nas faixas etárias de 15 a 19
anos (de 110,7 por cem mil habitantes em 1980 para 170,6 em 1995) e
de 20 a 24 anos (de 177,4 para 269).
Também no Brasil são as armas
de fogo que fazem o maior estrago.
Entre 1980 e 1995 a taxa de homicídios por armas de fogo no país subiu de 10 por 100 mil habitantes
para 38,18 entre homens de 15 a 19
anos. E de 21,66 para 63,68 entre
homens de 20 a 24 anos.
No Grande Rio, a taxa de mortalidade por armas de fogo subiu de
59 por 100 mil habitantes em 1980
para 184 em 1995 na faixa de idade
de 15 a 19 anos. Na faixa dos 20 a 24
anos, aumentou de 111 para 276
-taxa maior do que a encontrada
entre os negros norte-americanos
da mesma idade. Nada a ver com a
taxa de natalidade, que diminui
desde os anos 1970.
No entanto, entre 1981 a 1985, a
cidade do Rio de Janeiro tinha
13,9% de pobres; entre 1995 e 1999,
passou a ter 12,3%, ou seja, diminuiu a proporção de pobres na população total.
Jovens favelados e periféricos
perecem em contextos de enorme
trauma, sofrimento e crueldade
enquanto os intelectuais pretensamente corretos moram em locais
mais seguros e ainda pagam pela
segurança privada que garante
seus bens. Faz sentido?
Respeito à lei é processo coletivo
de aprendizagem. Demagogia é interesse próprio que alimenta o delírio de poder e virilidade dos jovens mal socializados. Vamos mudar de lemas: castigo bom é castigo
justo; respeito à lei é jogo em que
todos ganham.
ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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