São Paulo, quinta-feira, 29 de outubro de 2009

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Conta salgada

Ambiente pré-eleitoral prejudica racionalidade em debate do pré-sal, que tende a impulsionar gastos de má qualidade

O ROTEIRO tomado pelas discussões do novo marco regulatório para a exploração de petróleo no país era previsível. Governo e congressistas ampliaram a tendência para o gasto público de má qualidade a partir do que por ora é apenas uma promessa de recursos novos: a atividade petrolífera no chamado pré-sal.
A pressa da gestão Lula de aprovar a legislação a tempo de explorá-la na campanha contribui, assim, para minar um princípio corretamente acalentado por uma parcela do Executivo: é preciso evitar que o dinheiro do petróleo se torne um novo catalisador da gastança dos governos.
O projeto enviado ao Congresso partilha, em alguma medida, dessa preocupação. Propôs depositar todos os recursos obtidos pela União com o pré-sal numa espécie de poupança fiscal -chamada Fundo Social-, a ser aplicada, a juros, no exterior e no país, em projetos de infraestrutura por exemplo. Um modo eficaz de contornar a comichão gastadora do governo seria autorizar o uso apenas do rendimento desta poupança, nunca do principal, em despesas públicas.
Mas a ministra Dilma Rousseff, aspirante ao Planalto, não pensa assim. É uma das defensoras do gasto a fundo perdido com uma parcela dos recursos do pré-sal. Afirma que o Brasil tem carências sociais prementes e não pode dar-se ao luxo de esperar pelo rendimento do fundo -esquece-se de que setor público já consome quase 40% do PIB.
A querela, de todo modo, foi definida pelo relator do projeto na Câmara, o deputado Antonio Palocci (PT). O ex-ministro abriu a porteira para a gastança nos primeiros cinco anos de constituição do fundo: nesse período, o dinheiro que entrar poderá, de imediato, financiar despesas de custeio.
Outra manobra, esta feita para contentar Estados e municípios, aumentou a parcela de royalties destinada a esses entes federativos. A União, assim, terá menos dinheiro para transferir ao Fundo Social -seja pelo efeito da redução de sua fatia nos royalties, seja pela diminuição da parcela do petróleo que, no regime de partilha de produção, terá direito de dividir com as empresas vencedoras das licitações.
A experiência mostra que a tendência perdulária de Estados e municípios, quando se trata de recursos oriundos de royalties de petróleo, é praticamente incontrolável. A esta altura, melhor seria postergar esses debates para depois das eleições -ou vai faltar petróleo para cobrir tanta voracidade pelo gasto.


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