São Paulo, quinta-feira, 29 de outubro de 2009

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CLÓVIS ROSSI

Os cacos de uma cidade

SÃO PAULO - Mais um pedacinho da "minha" cidade está morrendo, o Liceu Coração de Jesus. Não que eu tenha estudado nele ou conhecido alguém que estudou lá. Fui a vida toda aluno de escola pública, mas sabíamos que o Liceu fazia parte das referências em educação particular, para a qual olhávamos, nos anos 50, começo dos 60, com um certo ar de superioridade.
Sim, os alunos da escola pública tínhamos motivos para essa sensação, mesmo que a comparação fosse com escolas de referência do ensino privado.
Que se haja privatizado a excelência já seria um péssimo sinal. Que a antiga excelência privada se desmanche junto com o desmanche da referência que era o centro da cidade é ainda mais doloroso.
Não gosto de saudosismo, não compartilho esse cântico tão argentino de que "todo tiempo pasado fue mejor", mas não há como não deixar cair uma lágrima por um e outro desmanche.
É verdade que a degradação do centro está longe de ser novidade. O arquiteto Fernando Serapião, em seu artigo de ontem para esta Folha, põe nos anos 60 o início de um dos sinais da decadência, qual seja, a transferência das escolas privadas para longe do centrão.
A cidade nem se deu conta, então, de que estava renunciando a manter seu centro vivo. Veio depois, a partir dos anos 90, uma série de tentativas de revitalização, palavra que por si só indicava a perda dos sinais vitais da área central.
Não deu certo, constata agora Fernando Serapião. Há ainda alguma chance para ter de volta a "minha" cidade? Nos EUA, também nos 90, havia uma onda sobre a decadência do que o jargão chamava de "inner cities", o centrão, em tradução livre.
Boa parte foi recuperada, ao menos parcialmente. Há alguma maldição que habita São Paulo e faz com que a decadência se sobreponha a um mínimo de civilização?

crossi@uol.com.br


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