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ELIANE CANTANHÊDE
Não é proibido gastar
BRASÍLIA - Como ministro da Fazenda do governo Sarney, nos anos 80,
Francisco Dornelles impunha superávit fiscal pesado, juros altos, arrocho. Aliás, seguindo à risca o discurso
escrito para o tio, Tancredo Neves, e
lido pelo sucessor de última hora, José
Sarney: "É proibido gastar".
Ortodoxo e cheio de si, o técnico
Dornelles foi chamado à razão (daqueles tempos) pelo então ministro
da Justiça, o político Fernando Lyra:
"Nós levamos 20 anos para chegar ao
poder. Você acha que a turma vai ficar sem emprego, sem verba, sem
obra? Você está maluco!".
Ao concluir que não tinha força para enfrentar a lógica política, Dornelles pediu o boné. Deu no que deu.
Uma festa! O ministro caiu, os cofres
se abriram, o PMDB foi bem votado
nas eleições e o governo chegou ao
fim com uma inflação recorde de
80%... ao mês! Sarney não tinha alternativa. Era ceder e ficar ou resistir
e sabe-se lá o que iria acontecer.
Duas décadas depois, a discussão
de gasta-não-gasta, de "ortodoxos" e
"heterodoxos", de "desenvolvimentistas" e "financistas" continua. A diferença é que Dornelles perdeu apoio
político com a morte de Tancredo, e
Palocci se enfraqueceu à custa de Burattis, Polettos, Barquetes. Quando
bateu, Dilma Rousseff sabia que podia bater. Palocci balançou. Talvez
não tenha caído, como o argentino
Lavagna, porque a oposição maneirou e Lula recuou.
Lula mandou Palocci e Dilma acertarem os ponteiros, sob a mais elementar constatação de que, com tanto solavanco ético, tanta inércia administrativa e um PIB negativo no
trimestre, não dá para brincar de
mudar a economia. Aliás, nem há
mais tempo para Lula e o PT negarem tudo e improvisarem outro discurso para o palanque reeleitoral.
Palocci abre um pouco a mão, Dilma arranca uns trocados a mais para
gastar, os dois posam de casal feliz e
toca-se a vida, rumo a 2006. Lula, Palocci, Dilma e o PT parecem, enfim,
perceber que a guerra não ajuda ninguém. Ninguém deles, claro.
@ - elianec@uol.com.br
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