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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Reinventar o social
Nesses 25 anos de mediocridade
imposta, passou a vigorar no
Brasil uma idéia perversa do social, recomendada por nossos tutores estrangeiros. O social não teria por tarefa capacitar a maioria assalariada do país.
Seria espécie de caridade destinada a
atenuar o sofrimento dos mais pobres
enquanto o país segue a cartilha da
confiança financeira e da imitação institucional a que se renderam seus quadros dirigentes.
Proponho reorientação radical. Em
todos os campos, garantir o básico de
oportunidades para todos -um primeiro trilho. E combinar essa universalização de oportunidades com um
segundo trilho, de oportunidades especiais para os mais talentosos e esforçados. Exemplifico a idéia nos dois
campos mais importantes: emprego e
ensino.
Na área do emprego, o primeiro trilho é acabar com a informalidade em
massa e estimular a contratação e a
qualificação dos trabalhadores mais
pobres. Para isso, abolir todos os encargos sobre a folha de salários, financiando os direitos trabalhistas por
meio dos impostos gerais. E assegurar
incentivo tributário a quem empregue
e qualifique trabalhador menos qualificado. Medidas que só se viabilizam
no quadro de uma política econômica
que substitua gastança em juros por
gasto em brasileiro.
O segundo trilho consiste em usar os
poderes e os recursos do Estado para
instrumentalizar a multidão empreendedora, imensa e desequipada,
que emerge de baixo. Em vez de usar
dinheiro de trabalhador e de contribuinte para subsidiar graúdo, difundir, entre os empreendedores emergentes, tecnologias e práticas avançadas e maneiras de ganhar escala de
produção e acesso a mercados. Muitas
Emprabas, muitos Sebraes, muitas
novas maneiras de baratear crédito e
tecnologia, ativamente promovidas
pelo governo -esse é o caminho.
No domínio do ensino, o primeiro
trilho é garantir mínimos de investimento por aluno e de desempenho
por escola em todo o país, monitorar
intensivamente os resultados, flexibilizar o regime federativo para facilitar
a transferência de recursos e quadros
dos lugares mais ricos para os mais
pobres e formar professores aptos a
ministrar ensino analítico e capacitador.
O segundo trilho passa pelo esforço
de identificar os alunos mais talentosos e esforçados e de lhes oferecer
oportunidades acadêmicas extraordinárias e apoios econômicos abrangentes. Vocês que não têm heranças ou
padrinhos, sejam herdeiros da República e vanguarda do povo brasileiro,
dirá a eles um Estado que não mais esteja no bolso dos endinheirados.
Tanto na economia quanto na educação, essa política social em dois trilhos -o fundamental e o extra- surtirá o máximo de efeito com o mínimo
de recursos. Reconciliará as urgências
do presente com as exigências do futuro. Dará braços para todos: base de
oportunidade e de capacitação. E asas
para quem possa e queira voar: vez para o talento, para a tenacidade, para a
obsessão criadora e construtiva.
O impacto dessa reorientação será
revolucionário e imediato, ainda que
alguns de seus frutos demorem a amadurecer. O país trocará a inibição pelo
dinamismo. O povo brasileiro será sacudido por onda de ambição e de esperança. O Brasil continuará vergado
sob o peso de muitos de seus defeitos.
Passará, porém, a ter o uso de algumas
de suas virtudes.
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.
www.law.harvard.edu/unger
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