São Paulo, quinta-feira, 29 de novembro de 2007

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CARLOS HEITOR CONY

Palavras demais

RIO DE JANEIRO - Deus conseguiu criar o mundo com apenas duas palavras: "fiat lux!" (o ponto de exclamação não conta, é um sinal gráfico, e não uma palavra). Para explicar a necessidade da prorrogação da CPMF, Lula e a turma do governo já gastaram mais de um bilhão de palavras -e o resultado está longe de ser luminoso, possibilitando a separação das terras e das águas, a criação do Sol, das estrelas no céu e dos pássaros na Terra. De quebra, do boneco de barro do qual tirou uma costela e tudo começou.
O pesquisador canadense Jonathan Schaeffer acredita que os computadores podem mais do que Deus, sem necessidade de usar nem mesmo duas palavras. Para jogar damas, um computador modesto tem 500 quintilhões de soluções possíveis. Para se ter idéia, 500 quintilhões é um 5 seguido de 20 zeros. Para jogar xadrez, as soluções envolvem um 1 seguido de 51 zeros. Troço pra burro. E sem necessidade de uma única palavra.
Os alfabetos das línguas do mundo têm a média de 20 e tantas letras ou signos. As combinações possíveis resultam num astronômico número que nem sei expressar. E todas elas servem para muitas coisas, principalmente para esconder o pensamento. O homem torna-se vítima de um tsunami de palavras.
Não sou entendido em jogo de damas nem em xadrez, mas acho que a vida é um jogo bem mais complexo, não tem tabuleiro nem peças com valores definidos. No dia-a-dia do homem comum, um peão pode valer um cavalo, e um bispo pode ser rainha. A vantagem do xadrez e das damas é que são jogados em silêncio, as coisas ficam valendo por si mesmas.
Na vida real, tudo é mais complicado, porque entram em cena as palavras, cuja finalidade maior é confundir o que já é confuso. A luz, quando é feita, torna maior a escuridão.


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