São Paulo, domingo, 29 de novembro de 1998

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Bens públicos e eficiência administrativa



A competição estimulada pelo governo garantia que haveria disputa em todos os segmentos do leilão
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

A escuta clandestina dos telefones da presidência do BNDES vem mobilizando a opinião pública para o debate sobre o comportamento das autoridades responsáveis pelo leilão de privatização da Telebrás.
Deve o administrador, nessa situação, adotar uma postura agressiva na procura do melhor preço para os cofres da nação, beneficiando toda a sociedade? Ou deve ele se manter completamente passivo em relação ao processo de venda de um bem público, limitando-se a atender aos atos burocráticos de rotina, como a publicação de editais de venda?
Essas duas posições assumem uma natureza polar ainda mais acentuada em situações como a da privatização do Sistema Telebrás, em que estiveram envolvidos grandes investidores internacionais e brasileiros.
Nesse caso, durante três anos, promoveu-se uma mudança radical do arcabouço regulatório em que as empresas privatizadas terão de operar durante os próximos 25 anos. O volume de investimentos necessários à execução das metas de universalização estabelecidas nos novos contratos de concessão, a partição de receitas de serviços telefônicos de longa distância e o quadro futuro da competição no mercado brasileiro de telecomunicações, entre outros pontos, criam incertezas sobre a rentabilidade das empresas à venda. E todos sabemos os efeitos que um quadro acentuado de dúvidas tem sobre o preço que os potenciais compradores estarão dispostos a pagar pelo bem público em leilão.
A ação do BNDES nesse contexto, procurando esclarecer as dúvidas mais fundamentais dos interessados, é absolutamente necessária para o sucesso da venda.
Foi o que aconteceu durante as semanas que antecederam o leilão das empresas do Sistema Telebrás. Nesse processo, também se juntou ao BNDES a ação da agência reguladora do setor de telecomunicações, a Anatel. Na ausência de decisões da Anatel relativas a questões regulatórias, em decorrência de sua criação recente, criou-se na Internet um banco de informações, em resposta a questões práticas levantadas pelos consórcios investidores interessados nas empresas da Telebrás.
O resultado desse esforço conjunto do BNDES e da Anatel foi que, às vésperas do leilão de privatização, havia pelo menos dois consórcios credenciados para cada uma das 12 empresas colocadas à venda. A competição estimulada pelo governo garantia que haveria disputa em todos os segmentos do leilão e, portanto, o aparecimento de importantes ágios nessa disputa. Com isso, ganhava o Tesouro; por consequência, toda a sociedade brasileira.
No dia anterior à realização do leilão, ocorreu um problema operacional em um dos consórcios inscritos para concorrer à empresa chamada Tele Norte Leste, que cobre a extensa área que vai do Rio de Janeiro ao Amazonas.
A equipe do BNDES desenvolveu, durante todo o dia, intensos esforços para que as divergências surgidas entre a Previ e o banco Opportunity não levassem à desmontagem desse consórcio e, em decorrência, à possibilidade de haver apenas um concorrente a essa empresa no leilão. Se isso acontecesse, o valor de venda seria igual ao preço mínimo estabelecido, com prejuízo para o Tesouro. Essa tentativa do BNDES foi bem-sucedida; no dia do leilão, havia duas propostas para a compra da Tele Norte Leste.
Esses são os fatos. O resto é utilização ilegítima de gravações parciais dos diálogos havidos na presidência do BNDES, obtidas de forma ilegal por marginais de colarinho branco.


Luiz Carlos Mendonça de Barros, 54, é engenheiro de produção pela USP (Universidade de São Paulo) e doutor em economia pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Foi ministro das Comunicações e presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).





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