São Paulo, terça-feira, 29 de dezembro de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Planos para o Ano-Novo

JUDITH BRITO


O Brasil está diante de uma encruzilhada. Pode escolher um caminho "bolivariano" ou pode aprender com o passado e optar pelo futuro

FIM DE ano é hora para balanços do passado e planos para o futuro. As pessoas pensam no que pretendem no âmbito pessoal e familiar. Empresas avaliam resultados e fazem os orçamentos para o próximo período. O próprio mundo tenta concatenar agendas de curto e longo prazo para um improvável desarmamento ou para o desaquecimento climático global. Países, obviamente, não podem fugir do roteiro. O Brasil já tem anunciado seus prognósticos otimistas para a economia -mas precisamos ter algum rumo claro do que queremos em relação à consolidação de nossa democracia.
A América Latina está numa encruzilhada: há exemplos de solidez no caminho da democracia, como os do Chile e do Uruguai. Esses países estão entre os que mais sofreram durante a onda de autoritarismo militar que assolou a América Latina entre os anos 1960 e 1990.
No Chile, houve execuções de opositores em estádios, tortura e perseguições políticas. No Uruguai, a população residente chegou a ter redução significativa em função da diáspora forçada de opositores e da perseguição e mortes pelo governo.
Hoje, passados -embora nunca esquecidos- os traumas, Chile e Uruguai seguem a trilha das democracias mais consolidadas do mundo. Além da regular agenda eleitoral, livre de tentativas de mudanças casuísticas nas regras, há o desejável debate e a aceitação das diferenças de opiniões. A imprensa é livre.
Infelizmente, o outro caminho da encruzilhada leva a experiências de retrocesso, como são os casos da Venezuela, da Bolívia e de outros seguidores do "chavismo" e, numa variante do modelo de autoritarismo populista, da Argentina, onde o discurso antimídia tornou-se o padrão. Nesses casos, a intenção é silenciar qualquer tipo de oposição, e jornais e outros veículos acabaram se tornando a crítica mais ácida -o que incomoda.
Trata-se de infantilidade política, da incapacidade de enfrentar frustrações. Quando não existe maturidade para aceitar as diferenças e as críticas, a atitude mais fácil é simplesmente impedir sua exposição ou tentar submetê-las a controles. Já sabemos que a combinação de propaganda a favor com a censura às notícias contrárias faz parte dos ingredientes típicos das ditaduras.
O Brasil está diante da encruzilhada. Pode escolher um caminho "bolivariano", caso sigamos pauta de debates como a proposta pela Confecom, a recém-encerrada Conferência de Comunicação Social. Discursos como o controle da mídia ou a instituição de conselhos de jornalismo são opções pelo retrocesso. Já sabemos aonde vai dar esse caminho: na prática, significa calar as vozes opositoras e impor uma única forma de pensamento, uma única orientação política.
Mas o Brasil pode também aprender com o passado e optar pelo futuro, pelo amadurecimento de suas instituições políticas e pela consolidação de sua democracia.
Há uma agenda de temas importantíssimos a cumprir -como o das novas mídias digitais- que, na prática, trazem paradigmas ainda não decifrados.
Os pilares do verdadeiro jornalismo sempre se sustentaram num paradoxo: a independência editorial exige equilíbrio econômico-financeiro das empresas jornalísticas; por outro lado, um publisher deve ser capaz de tomar decisões além dos interesses negociais da corporação, para que a sagrada independência seja preservada. As globalização de grandes plataformas tecnológicas e infraestruturas de dados pode passar como rolo compressor sobre tais modelos e princípios sobre os quais se assentam o próprio regime democrático. Esse é o novo desafio a exigir nossa atenção.
Não podemos voltar a discursos antigos ou a projetos já superados. Nossas energias precisam ser gastas na consolidação do que já conquistamos até aqui, não em rediscutir conceitos e modelos já superados, cujos resultados, já conhecidos, são desastrosos. A opção brasileira precisa ser pelo caminho da democracia, não pela via do autoritarismo populista.
A Associação Nacional de Jornais continuará a defender seus princípios com a mesma tenacidade com que tem feito desde a sua fundação, há 30 anos. Neste encerrar de um ano de sucessos, no qual o país conseguiu vitórias expressivas, como a revogação da Lei de Imprensa do período militar, a ANJ deseja a todos os brasileiros que 2010 seja um ano maravilhoso, pleno de liberdade de expressão.


JUDITH BRITO , 51, é presidente da ANJ (Associação Nacional de Jornais) e diretora-superintendente da Empresa Folha da Manhã S.A., que edita a Folha.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


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