São Paulo, terça, 29 de dezembro de 1998

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"No palitinho"

ELIANE CANTANHÊDE

Brasília - A Câmara dos Deputados, o Congresso Nacional, o Estado de Alagoas, o Brasil e o Natal bem que poderiam passar sem mais essa: o assassinato da deputada Ceci Cunha.
O crime não é uma ficção, e o principal suspeito não é o mordomo. É o suplente de deputado Talvane Albuquerque, o primeiro na fila para ocupar a vaga da deputada agora e/ou na próxima legislatura.
A cruel ironia é que, se assumir, Albuquerque terá conquistado simultaneamente mandato e imunidade. Só poderá ser processado com autorização da Câmara.
O inquérito não acabou e o julgamento nem começou, mas a sensação de que é culpado é tão generalizada que as presidências da Câmara e do Senado já discutem rito sumário para cassação ou quebra de imunidade.
Numa entrevista publicada ontem, Albuquerque só deixa uma alternativa: ou é praticamente imbecil, ou absolutamente cínico.
Disse que teve "só dois" encontros, mas que falou "incontáveis vezes" por telefone com o pistoleiro que matou Ceci Cunha. Do que tratavam? Do assassinato de um outro deputado da sua coligação, Augusto Farias.
Primeira impressão: tanto faz, tanto fez se o morto fosse Augusto Farias, Ceci Cunha, João, Pedro ou Maria. O importante é que abrisse vaga para Albuquerque na Câmara.
Segunda impressão: a escolha de Ceci foi quase "no palitinho", ou na base do "uni, duni, tê".
Augusto tinha a "vantagem" de ser irmão de PC Farias, cunhado oficial de Elma Farias e extra-oficial de Suzana Marcolino. Uma morte a mais, outra a menos...
Ceci tinha três "vantagens": durona nas votações de verbas, irritava deputados fisiológicos e empreiteiros; não era conhecida do pistoleiro, como Augusto; e, enfim, era mulher.
Um crime é sempre escandaloso, mas esse extrapola qualquer limite. O que leva todo mundo a um veredicto: "Só podia ser em Alagoas".
Mas, pensando no Rio, em São Paulo, na ambição, na disputa de poder, na falta de escrúpulos, bate uma dúvida: só podia mesmo ser em Alagoas?



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