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Do cachimbo e de seu uso
CARLOS HEITOR CONY
Rio de Janeiro - Dominado o fogo,
o homem cozinhou alimentos e achou
que podia aproveitar o seu subproduto mais óbvio. Talos de plantas com
caule oco serviram para aspirar a fumaça -que não era lá essas coisas.
Mas o cachimbo estava inventado.
Daí até chegar aos cachimbos de nó
de cerejeira, aos "dunhill" e aos "savinellis", demorou um pouco, mas foi
aparentemente mais fácil do que chegar à Lua e ao computador pessoal.
O homem sempre procurou aspirar,
se não a um alto destino, ao menos a
qualquer coisa que lhe provoque a
sensação de euforia, lucidez ou calma.
Usou rapé nas narinas, agora usa cocaína. Entre o rapé e a coca, o fumo
ficou no meio-termo e, antes da onda
que o acusa de dar câncer, infarto e
impotência, ele foi tão importante que
até hoje figura, em forma de folhas
verdes, no escudo oficial do Brasil.
O cachimbo, embora mais antigo, ficou no meio-termo entre o cigarro e o
charuto. Sherlock Holmes o usava
sempre. E, embora também se servisse
de cocaína e tocasse violino, o cachimbo lhe era mais útil do que o dr. Watson, que não passava de um elementar. Tal como no caso dos "pretos
véios" da umbanda, o cachimbo formou-lhe o logotipo.
Primeira regra obedecida fanaticamente por quem não sabe fumar: deixar-se fotografar de cachimbo na boca
ou nas suas proximidades. Bing
Crosby, por exemplo, com aquela voz
de Papai Noel que fazia sucesso no
Natal, foi um dos emblemas do mau
fumador de cachimbo. Nove entre dez
capas de seus discos o mostram segurando o cachimbo. Roberto Carlos não
fica atrás.
O encanto do cachimbo é outro. Ele
foi feito para o silêncio, até mesmo a
solidão. É o companheiro da reflexão,
equipamento de mergulho para o homem dentro de si mesmo. É muito eficiente, também, para depois do amor.
A começar pelo perfume, que combina
com o cheiro dos lençóis -se há lençóis na jogada. E pela nuvem da fumaça que cria no espaço aquelas curvas arredondadas, que entram umas
dentro das outras. Olhadas com atenção, essas curvas convidam para mais
uma vez.
Excepcionalmente, republicamos hoje coluna de Carlos
Heitor Cony publicada em 10/11/95.
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