São Paulo, quinta-feira, 30 de abril de 2009

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Punição pelo voto

Sistema de eleição proporcional dificulta o controle dos cidadãos sobre o comportamento dos parlamentares

NÃO É apenas de indignação o sentimento que predomina diante dos desmandos verificados no Congresso. Quem quer que tenha acompanhado a crônica política dos últimos dez (ou 20) anos encontrará razões para o desalento.
Parlamentares que, durante algum tempo, tornaram-se símbolos nacionais da corrupção e do descrédito institucional veem-se tranquilamente reconduzidos, depois de breve ostracismo -quando muito-, aos cargos que sua atuação pregressa havia enxovalhado.
Num país em que se tornou lugar-comum constatar a impunidade dos crimes de colarinho branco, é ainda mais agudo e exasperante o fenômeno que se poderia chamar de impunidade eleitoral.
A falta de memória e o precário acesso à informação política representam, sem dúvida, fatores decisivos na perpetuação desse estado de coisas.
Algumas características do sistema eleitoral brasileiro agravam, todavia, o clima de desinformação e impunidade que se instituiu. Já se fez referência, neste espaço, aos efeitos negativos do voto obrigatório sobre a relação entre a população e seus representantes.
O mecanismo do voto proporcional contribui para o mesmo efeito. Mesmo o eleitor mais atento e informado tem dificuldades, nesse sistema, para escolher seu candidato a deputado ou a vereador. Centenas de postulantes disputam o seu voto a cada eleição.
Prevalecesse o voto distrital, a escolha passaria a seguir as regras que vigoram nas eleições para cargos majoritários, nas quais apenas alguns candidatos a governador, prefeito ou senador se apresentam para concorrer.
Imagine-se que um deputado responsável por irregularidades viesse a buscar a reeleição em seu distrito. Seria ao menos forçado, pela própria dinâmica do debate com seus adversários, a prestar contas do que fez.
No sistema proporcional, essa possibilidade se esvai, na medida em que não se tem um candidato em confronto direto com alguns de seus pares, mas, sim, a dispersão absoluta de inúmeros postulantes tratando de granjear eleitores por toda parte, sem sofrer contestação direta pelo seu comportamento.
São conhecidas as distorções que o voto distrital puro pode trazer na representação da vontade popular. O mecanismo despreza, por exemplo, a votação obtida pelos partidos que tiverem sido derrotados em cada distrito. A crítica não se aplica ao voto distrital misto, que prevê dispositivos capazes de reequilibrar o peso das bancadas partidárias, sem prejudicar esse confronto entre candidatos -e o acréscimo de responsabilização política que isso acarreta.
Nenhuma reforma eleitoral, por certo, é capaz de evitar o desmando e o descaramento de representantes eleitos. Mas não há dúvida de que, no sistema político atual, reduz-se drasticamente a possibilidade de puni-los, como merecem, pelo voto.


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