São Paulo, terça-feira, 30 de maio de 2006 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ROBERTO MANGABEIRA UNGER Repensar a economia PARA QUE o Brasil siga novo
rumo, não basta ter alternativa de poder. É preciso ter alternativa de idéias. Vejam, por
exemplo, como estão errados os
termos do debate econômico entre
nós e quanto o erro acorrenta o
país. Essa desorientação intelectual tem causa: quando os intelectuais esquerdistas perderam a fé
no estatismo, abraçaram o keynesianismo. Menos a doutrina de
Keynes (que mudava de década em
década) do que as fórmulas, hoje
fora de época e de contexto, de seus
seguidores americanos: gastar para
crescer e deixar que a dinâmica do
crescimento estimule formação de
capital e aumento de produtividade. Exemplifico.
Superávit fiscal. A direita gosta, a
esquerda não. Mas a esquerda deveria gostar e usar para objetivo
oposto ao da direita: não para enquadrar o Estado, mas para libertá-lo da dependência de confiança financeira. A verdade dura é que tem
de aumentar, e não diminuir, o superávit. E usar a condição ganha
com esse sacrifício para forçar baixa radical no juro. Diminuindo o
gasto no juro e elevando a idade da
aposentadoria, recupera-se o poder de investimento público.
Transigir com frouxidão fiscal é
sepultar a capacidade estratégica
do Estado para investir e para democratizar.
Poupança e investimento. Teoricamente, a poupança é mais efeito
do que causa do crescimento. Direita e esquerda concordam: deixemos o crescimento resolver. Não
resolve, porque não acontece. Nenhum país se desenvolve, ou se rebela, fiado no dinheiro dos outros.
Precisa mobilizar seus recursos e
inovar em meios para canalizar a
poupança de longo prazo ao investimento de longo prazo. Só assim
evita ter de ficar de joelhos. Deveria ser a tese da esquerda.
Produtividade. Para a direita,
basta adotar regras que agradem
credores e investidores. A esquerda finge-se de desentendida, confiando na aliança entre o Estado e
as grandes empresas. Erram ambas. Só o aumento da produtividade viabiliza o desenvolvimento e
nos exime de apostar em força de
trabalho barata e desqualificada.
Um país como o nosso não sustenta aumento de sua produtividade
sem assegurar oportunidade econômica e educativa a milhões de
pessoas, inclusive milhões de empreendedores emergentes, que vivem à míngua dela: acesso a crédito, a tecnologia e a conhecimento;
difusão, pública e privada, de práticas produtivas avançadas. É o que
deveria propor a esquerda.
Se quisermos botar o Brasil para
trabalhar e para aprender, joguemos fora o financismo fiscalista e o
keynesianismo fossilizado. E tratemos de pensar.
ROBERTO MANGABEIRA UNGER escreve às terças-feiras nessa coluna. Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: O futuro de Lula Próximo Texto: Frases Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |